Comentário Breve: Três em Linha e Outros Jogos da Pandemia Notável
Numa altura em que o silêncio é imposto, consciente e inconscientemente (quando não é a máquina de comunicação, são os próprios adeptos uns aos outros, na euforia), com níveis de censura raramente vistos, tudo em nome da alegada estabilidade de uma modalidade do clube – uma correlação inculcada a todo o custo através da repetição de uma ideia sem nexo – fomos brindados com um ressurgimento notável em todo o seu esplendor e de magnificência ininteligível. Têm regras próprias. Os adeptos, esses, continuam silenciados excepto se cumprem o desígnio pretendido. Porquê olhar para dentro se os problemas estão todos lá fora? As últimas décadas foram limpinhas dentro do estádio de Alvalade, sobrava orçamento para muitas flores, toda a gente saía mais pobre do que entrava, e os automóveis de gama alta novos apenas disfarçavam a fome. Admito desde já que eu próprio tenho optado pelo silêncio, pois não quero ser acusado de causar uma derrota, sendo esmagado sem contemplações pelo natural sentimento de culpa, misturado com uma sensação de omnipotência.
É todo um paradigma de democracia contemporânea, pena ser inconstitucional até na essência, mas isso não importa minimamente: é a impoluta esfera desportiva nacional, que nos determina o ser e a vida; resta estarmos agradecidos, sermos obedientes, prestarmos a devida vassalagem e pagarmos o dízimo. No tempo livre que nos é graciosamente disponibilizado, há espaço e autorização para alguns jogos que não obrigam a sobrecarregar os nossos indesejados neurónios.
Três em Linha
Se a linguagem do Poker foi importada como artifício retórico (eg. all-in), para rapidamente se fugir à nomenclatura do jogo assim que negócios estratosféricos começaram a ter lugar e se adiantaram receitas televisivas e de transferências de jogadores, convém nesta ocasião recorrer a um jogo ao nível dos intervenientes. Fez-se um Três em Linha: Filipe Soares Franco, José Roquette e António Dias da Cunha. Os funcionários que sofreram lay-off, aqueles que pagam por serviços não fornecidos aos filhos, e os que foram despedidos em nome do que o leitor queira acreditar, não estão convidados a participar.
Batalha Naval: Afundar Navios
Primeiro surgiu Filipe Soares Franco, numa carta aberta que só nas mentes mais perversas poderia ter a mão da comunicação do clube – foi completamente espontânea no surgimento e no destaque, tanto que até o treinador se teve de pronunciar sobre a mesma, e sabemos que não recebe briefings. Uma pessoa que meteu Rogério Alves no clube em 2006 para nunca mais sair do cargo de PMAG de uma maneira ou de outra (ie. indirecta), que vendeu património do Clube abaixo do preço de mercado, que dedicava 2 horas por dia à instituição pois a desgraçada da Opway era o seu amor, que concluiu o mandato com um prejuízo adicional de 55 milhões de euros, que queria um clube sem adeptos incómodos, e que afirmou peremptoriamente que “o futebol é prejudicado pelas modalidades“. Vendeu a ideia com sucesso a muitos “leões”, o mesmo sucesso com que Rogério Alves recorreu ao Conselho Leonino para contornar o decidido em Assembleia Geral do Clube para despachar património. Houve uma enorme revolta na altura, até tremeram e pensaram em emigrar, pois toda a gente sabe que os Sportinguistas não se deixam manipular pelos notáveis. Apenas não existem notícias sobre esse assunto.
Posteriormente, surgiu o eterno José Roquette. Um resquício de tempos que os portugueses prefeririam que não tivessem existido, mas admito que já não meto as mãos no fogo por esta afirmação. Tempos esses nos quais figuras como o amigo (e familiar distante) Ricardo Salgado ou Oliveira e Costa reinavam com autoridade moral e técnica suprema.
Se foi pela mão da referência João Rocha que o senhor José Roquette acedeu a um cargo no clube, o de vice-presidente, assumindo Rocha depois de forma implícita o desastre dessa opção na classificação do que foi o malfadado Projecto Roquette, foi pela mão de José Roquette que João Rocha foi levado a tribunal, só vendo o processo retirado em 2011 com o agravar do seu estado de saúde.
Roquette acedeu à presidência do Clube colocando primeiro Pedro Santana Lopes como “testa de ferro”; logo após o início do mandato do então Menino Guerreiro – que continua com o mesmo espírito sendo desnecessário capotar com o automóvel para o provar – foi oferecido todo um luxo aos adeptos do Clube.
Como sabem, nem um ano após assumir funções com a eloquência de um assertivo “acabou-se a brincadeira!”, Santana acabou mesmo com ela e entregou o cargo ao verdadeiro líder, José Roquette. Este majestoso “leão” foi o responsável por introduzir as SAD em clubes nacionais, criando um emaranhado de empresas e cargos ocupados pelo seu vasto círculo de elevadíssimo gabarito na Comunicação Social, que provocaram uma multiplicação meteórica do passivo do Sporting Clube de Portugal, com a apoteose em 2013: um PER em cima da mesa.
No percurso altruísta e humanitário, não houve banco no qual não tivesse estado envolvido de alguma forma: BPN, CGD, BES, Totta, BCP, e até BPP (João Rendeiro). Apresentado agora como um regenerado homem da terra, contando com várias campanhas mediáticas nesse sentido, nesta ocasião cortesia de uma estranhamente dócil e reverente Fátima Campos Ferreira, não se coibiu de defender Ricardo Salgado na sua componente humana, alegando até remorsos no dourado coração de Salgado, que os miseráveis lesados de estirpe inferior não são capazes de internalizar. Prossegue, no entanto, na senda de enganar conscientemente a respeito do que foi a única gestão que deu lucro ao Clube pós criação da SAD, aumentando o activo, reduzindo o passivo, aumentando a massa adepta e associativa, desde que Roquette decidiu reclamar uma superioridade dinástica para tomar as rédeas do Clube de 3.5 milhões de adeptos que alegremente garantem financiamento e valor. Já o fizera antes, continua a fazê-lo, e sendo que não é nenhum idiota, pelo contrário, é tão só demonstrativo da autêntica pessoa por trás das múltiplas campanhas publicitárias, e de uma imprensa amiga e protectora desde há demasiados anos.
Deve custar ver alguém tão instruído na finança, que deu tanto à banca nacional (extremamente saudável e sem escândalos, como sabemos), ser trucidado na gestão de um clube enorme por alguém muito afastado do seu muy nobre círculo filantrópico. Julgam que ele não sabe que o activo em 2013 era negativo em 120 milhões de euros, passando a positivo no final de mandato da administração de Bruno de Carvalho? Julgam que ele não sabe do crescimento exponencial que o clube registou em todas as suas vertentes basilares? Como referi, não é nenhum idiota, longe disso, é apenas e tão só uma questão de ego e de projecção de poder. Podem ver um sumário do vídeo neste link.
Roquette mudou mentalidades no clube. Tornou o Sportinguista passivo, desligado, sobrevivente à base de momentos, e conformado. É o criador da “herança mais pesada” (negativa) que o clube conheceu na sua história centenária, mental e materialmente, uma que tardará mais de uma geração a reverter, se for sequer possível. A primeira tentativa falhou, pois subestimou-se o que eram quase 20 anos de manipulação e fabricação mediática de uma identidade nada relacionada com um leão.
Por fim, surgiu o companheiro de sueca de Luís Filipe Vieira: o confrade António Dias da Cunha.
Desde o primeiro dia apoiante de Frederico Varandas e opositor de Bruno de Carvalho, foi o homem que lançou críticas públicas ao então treinador Augusto Inácio na época em que este se viria a sagrar campeão nacional, em 1999/2000, quebrando um jejum de quase 18 anos. “Faz o que eu digo, não faças o que eu faço“.
Posteriormente, o milagre Mário Jardel, uma operação que teve um misto de sorte (desinteresse de rivais) e de engenho de algumas figuras na estrutura (como Miguel Ribeiro Telles), deu-lhe o título de campeão nacional como Presidente, ficando à frente do… Boavista. Na época seguinte, provou o crescimento sustentável e afirmativo no qual os adeptos piamente acreditaram, com o Sporting a terminar a 27 pontos do campeão, com o invejável registo de 8 derrotas e 9 empates. Nos anos seguintes, o Sporting repetiu sempre a meritória terceira posição para gáudio dos adeptos que rugiram fervorosamente – espiritualmente, para não provocarem derrotas.
Não pode ser acusado de falta de coerência. O homem que ficou conhecido por usar a palavra “sistema”, em forma de bitaite sem nunca concretizar, e que contribuiu inconscientemente para a ascensão do maior polvo que o desporto nacional já conheceu pela mão de um amigo dele, com ramificações para a esfera judicial, financeira e política do país, foi sempre uma pessoa que soube de que lado estava. As pessoas é que têm fraca memória, e não é só um problema do Clube, mas infelizmente um do próprio país. Não se deve, no entanto, afirmar tal coisa ou poderemos pôr em risco o IDE e até o PIB.
A futebolização correu muitíssimo bem, a finança e o património foram um mimo que importaram as boas práticas da banca nacional, e o ecletismo esteve sempre salvaguardado desde a anteriormente referida medida de 1995 até ao andar de casa emprestada em casa emprestada. Um fenómeno digno de Sísifo, transcendendo a simbologia de um leão, que só conheceu um término após a demolição do antigo estádio com a inauguração do PJR em Junho de 2017. Os Sportinguistas não esqueceram, e atentos como sempre, permitiram a ratificação da expulsão de quem erigiu o pavilhão, nesse mesmo espaço.
Três pessoas que alcançaram a presidência por cooptação. Três especialistas no jogo Batalha Naval, a quem infelizmente não foi ensinado que o objectivo era afundar a frota do adversário. Vamos passar ao terceiro jogo.
Quem é Quem: O Melhor Presidente da História
São já imensas as polémicas nas quais a administração de Frederico Varandas se envolveu, particularmente numa guerra interna contra inúmeros adeptos, associados, oposição, tendo começado a alterar a estratégia superficialmente à medida que os bons resultados no futebol se sucediam e a pandemia os atirou para longe, e após centrar as agulhas em Pinto da Costa. Foram também várias as polémicas motivadas por auto-promoção descarada, como foi exemplo o seu voluntariado à força, que viu a imprensa ao serviço transformar a história num acto quase heróico e que caiu muito mal junto de vários médicos no terreno. É multifacetado: médico virologista, fisiatra, herói de guerra, voluntário, autarca, presidente, empresário, exímio professor de línguas estrangeiras. Podia ser feito um jogo de “Quem é Quem?” apenas com Frederico Varandas em todas as casinhas, aparecendo sempre diferente, mas seria muito pouco apelativo, ou quiçá premium. Vamos recorrer a duas pessoas que sabem a descrição-chave para a identificação imediata. Uma das várias polémicas esquecidas envolveu a estimada cantora da Marcha Sporting, Maria José Valério, de 87 anos e com um estado de saúde debilitado.
Menos de quatro meses depois, Valério surgiu no estádio apenas para matar saudades.
Antes dessa aparição que lhe valeu assobios, completamente errados pois as pessoas já têm idade ou responsabilidade social para perceber as causas das coisas e o que são estratégias de propaganda, amiúde com instrumentalização do visado, Valério apareceu na Sporting TV junto a uma atenta vice-presidente de nome Maria José Engrola Serrano Biléu Sancho, aparentemente simpática. Esta vice-presidente foi falada recentemente a respeito de um par de despedimentos por incompatibilidades mas que foram, naturalmente, por motivos financeiros. Valério não só se enganou no nome de Varandas, como pronunciou algo, sem qualquer surpresa da vice, completamente fora de contexto e visivelmente forçado. “(…) ao melhor e maior presidente de todos os tempos… (pausa) Dr…Francisco Varandas“. O vídeo pode ser visto na íntegra neste link.
Questionam agora, e bem, porque razão me recordei deste momento quando supostamente a minha memória deveria estar em branco, embriagado pelo primeiro lugar no futebol. Agradeço a pergunta, sendo que a explicação é simples. Em primeiro lugar, gosto muito mais de Xadrez do que dos restantes jogos referidos neste artigo. Em segundo lugar, vou de seguida fazer um desenho de fácil compreensão:
No jogo deste tópico, não é necessário adivinhar o aspecto ou a indumentária variada. Basta dizer “o melhor presidente da história”, e está encontrado Frederico Varandas, pois só há um que se presta intencionalmente a esse papel.
Enquanto a uns – adeptos, pessoas livres, cidadãos, que muito dão ao clube – é imposto silêncio e auto-censura, outros são colocados a difundir propaganda saloia em jogos infantis. Não gosto nada de ver isto em nenhuma esfera da sociedade. Resta-me ficar calado, pois mandam em mim e tenho os direitos de cidadania confiscados por suprema autoridade moral e intelectual administrativo-clubística. Um agradecimento ao Leão da Arrábida pela inspiração.
Até à próxima.