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Sexta-feira, Abril 19, 2024

Neste dia… em 1968, Sporting goleia os espanhóis do Valência por 4-0

Lourenço faz o 1-0.

TAÇA DAS CIDADES COM FEIRA SPORTING: UM PASSO GIGANTESCO

Por Encarnação Viegas

Ganhou o Sporting. Quatro a zero. Marca concludente que, a avaliar pela expressão numérica, não deixa margem para dúvidas. Sobretudo àqueles que não estiveram em Alvalade. Um sucesso substancial que toma tal expressão, também não consente especulações críticas, particularmente, se estas pretenderem tomar uma feição adversa.

A equipa «leonina» teve, porém, ontem à noite, a par de períodos de futebol verdadeiramente louváveis, outros, excessivamente longos, em que a sua sua actividade se revestiu de aspectos pouco laudatórios, quer na produtividade, quer ainda, e, em especial, na esquemática posicional que alardeou. Esqueçamos, embora não totalmente os segundos e reconheçamos que o Sporting de ontem, no decurso dos primeiros quinze minutos, plenos de «elan e de entusiasmo, e depois, após os 2-0 quando a traço mais firme começou a esboçar-se o triunfo, chegou a atingir excelente laboração ofensiva, com uma frente de ataque, cuja extensão, chegou a medir-se pela largura do rectângulo: Quando Marinho (no segundo tempo) e Chico permaneceram, mais tempo, junto às linhas laterais ou, quando Lourenço e Ernesto procuraram, perto delas e, no sentido longitudinal, os espaços, as zonas que a marcação individual dos levantinos consentia, uma movimentação acelerada, em variações bruscas de ritmo, então sim, o Sporting sugeriu a ideia de que poderá vir a ser uma autêntica equipa, no colectivismo dos esforços, no entendimento dos sectores, já que a turma parece reencontrar o processo linear de caminhar para a rede e, o que legitima ainda mais as esperanças verde-brancas, começa a visar, convictamente, a baliza, com forca, direcção e… oportunidade.

Não poderemos, no entanto, esconder que por vezes, chegou a pairar no Estádio José Alvalade, uma estranha onda de frustração, Ainda que o primeiro golo «leonino», de LOURENÇO, tivesse surgido dentro dos trinta minutos iniciais, inequivocamente, que a turma do Sporting, só suportou a natural reacção espanhola, porque o seu sector defensivo se comportou, na emergência, com a inegável classe que se lhe reconhece, a que aliou um iniludível desejo, de guardar, avaramente, o precioso tesouro, que o seu dianteiro alcançara, os defensores leoninos foram, na verdade, estoicos, contando no entanto entre esse núcleo brilhante, com dois homens cuja refulgência os situa no estrelato de primeira grandeza: Armando e Damas.

Magnífico foi o excelente ultramarino, defesa central dos lusitanos. Atento, seguro nos desarmes, oportuno nas entradas, Armando pode acorrer, sempre, em apoio dos companheiros, quando estes necessitaram do seu auxílio, mas também, inconformista, quis tentar outras vezes, uma colaboração mais activa com os restantes compartimentos da equipa. Ocorre-nos uma prolongada fuga pelo corredor central, em que foi, até ao outro lado do campo, «discutir» com a defesa! contrária, a penetração na grande área da rede de Pesudo. Damas por outro lado, manteve o zero na sua rede. E se recordarmos que, entre os dianteiros levantinos, figuravam homens de prestígio firmado como rematadores, (Waldo e Ansola) além de Claramunt , temos de convir, que teve mérito, a acção do jovem keeper dos «leões». E nem se infira que Damas teve noite tranquila. Em quantidade talvez que os espanhóis a muito o não forçassem, mas em qualidade… Basta lembrar aquela prodigiosa parada, a disparo de ANSOLA, exactamente à passagem da meia hora para se poder aquilatar da valia do novo diamante, que surgiu, esta temporada, na baliza de uma equipa em cuja história se escreveram nomes de grande fulgor como guarda-redes: Azevedo, Carlos Gomes…

Voltemos porém ao jogo. Ao jogo que os espanhóis vinham dispostos, a perder talvez, mas por um resultado que lhes proporcionasse a fé numa rectificação, no despique da segunda mão, Assim no-lo sugeria o inicial 4-4-2, onde apenas Ansola e Paquito tomavam autêntica posição atacante e, que logo, por mérito de uma efectiva elasticidade, se transformava num eficiente 4-3-3 com a inclusão em alternância de Waldo, Machicho ou Claramunt , nas zonas mais adiantadas, ás vezes, de forma a estabelecer o equilíbrio numérico e, a deixarem, frequentemente, a ideia de turma de melhor toque de bola, de mais exacto jogo de posição, de mais evidente sentido de entreajuda e, até, de progressão, mais clara e lúcida. Culpados deste substrato de futebol, alardeado pelos visitantes? Apenas os sportinguistas. Esqueceram, depois dos bons apontamentos iniciais, a obrigatoriedade, do esférico rolar junto à relva, antes de entregaram a uma toada de pontapé alongado em que os seus sectores recuados incorreram frequentemente, de passe por alto, a impor uma problemática de choques a Lourenço e seus pares, na missão finalizadora. E nem Pedras, José Morais ou Gonçalves depois, se sentem muito à vontade nesse contexto futebolístico desapoiado, em que o jogador se vê rodeado de antagonistas, sem divisar um companheiro, nos metros mais próximos, que o ajude a transpor à vigilância de que é alvo. O próprio irrequietismo de Chico não encontra terrenos propícios ao seu futebol irreverente, pelo temor à fuga a uma esquemática que transformou algumas vezes a formação «leoninas», numa… formatura.

Não se revelaram, porém, os visitantes, equipa em plena forma, sobretudo no que respeita à concretização das jogadas que procuraram incubar e, o Sporting, logo que Pesudo deixou fugir para a sua frente, ao tentar a defesa, um potente remate de Lourenço, em que Gonçalves, na sequência, o obrigou a ir ao fundo da rede buscar a bola, o Sporting, dizíamos, então mais confiante, mais sereno, mais seguro de que só muito, dificilmente viria a perder o jogo, pôde então desbobinar uma série de jogadas, autenticamente perigosas, ao primeiro toque, numa movimentação uniforme e, quase diríamos, certa, se ainda não se observassem breves hiatos na continuidade das jogadas. Ainda que, numa toada pouco vistosa, mas reconheça-se, suficientemente prática e contundente, os «leões» fizeram avolumar o resultado, dando-lhe, talvez, um cariz de exagero, mas que, no fundo, traduz, para além da felicidade que (finalmente) o Sporting teve, em momentos de finalização, uma diferença acentuada, em relação ao adversário, na forma de caminhar para a rede. Menos vistoso, o Sporting foi, contudo, mais galopante, mais contundente. Justificado, portanto, o desnível no «score» final.

Falámos já do Sporting. Analisemos o Valência mais objectivamente. A equipa sabe jogar. Demonstrou-o ontem, sobejamente, Mas demonstrou, também, uma precária condição técnico-estratégica, no sentido colectivo. Cheia de bons executantes, traçando acertadas triangulações, sempre com um ou mais jogadores a apoiar o que conduz o esférico. O conjunto branco revela-se (ontem, pelo menos, foi assim) com acentuada carência de intencionalidade, de poder de remate, o que de certo modo surpreende nos espanhóis. Apenas Waldo e Ansola tentaram mais insistentemente apoquentar Damas, mas de longe e apenas uma vez, com força (o brasileiro mandou um petardo à barra da baliza de Damas, aos 18 minutos, que fez estremecer o estádio). Paquito não se viu como finalizador. Claramunt é o estratega da turma e, quanto a Sol, que deveria coadjuvá-lo e, a Waldo, nas tarefas do meio campo, ontem desmereceu do seu nome. Ou então entrou em eclipse total, Quanto ao compartimento defensivo, que utilizou uma marcação individual, embora sempre que o Sporting detinha o couro, procurasse, e conseguisse, ter vantagem unitária perto da rede (até pela aceitação dos «leões» que raramente meteram mais de quatro homens na zona de tiro) o último reduto valenciano, pareceu-nos (guarda-redes incluído) demasiado permeável, ainda que de razoável capacidade física. E quanto a iniciar ofensivas… nada. Parece, possuir apenas, o conceito destrutivo, a que dificulta a tarefa dos companheiros. Mas talvez que ontem, à ordem fosse exactamente essa: destruir, o resto ficaria para Valência. Mas já não terão muitas possibilidades. Quatro golos à defesa do Sporting… não se nos afigura ao alcance do Valência que esteve em Lisboa.


Estádio José Alvalade, em Lisboa. Árbitro Lacoste (França).
SPORTING – Damas; Pedro Gomes, Armando, José Carlos («cap») e Hilário; José Morais e Pedras; Chico, Ernesto Figueiredo, Lourenço e Gonçalves.
VALÊNCIA – Pesudo («cap.»); Jesús Martinez; Tatono, Aníbal Perez, Sol e Panchulo; Paquito, Claramunt e Waldo; Ansola e Machicho.
Na 2.º parte Márinho substituiu José Morais, mas actuou no ataque, recuando Gonçalves.
Ao intervalo: 1-0.
Marcadores: Lourenço (25 minutos), Gonçalves (56), Lourenço (73) e Ernesto Figueiredo (83).

Fonte: Diário de Lisboa

Data: 18/09/1968
Local: Estádio José Alvalade
Evento: Sporting (4-0) Valência 1968-69, 1ª mão - 1ª Eliminatória da Taça das Cidades com Feiras

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