A Tocha de Mário Monteiro
“Toda a gente sabe.” (Pedro M. Candeias, Sic/Expresso) Uma das frases mais perigosas que pode ser dita por quem lida com informação complexa, contraditória, contaminada, e muitas vezes de valor residual na especialidade da matéria em causa. Remete para uma sabedoria popular que nunca extravasa o campo teórico e que no plano sociológico práctico se prende apenas com uma recepção passiva de ideias generalistas e a sua adopção/reprodução com a mesma base de sustento “sólido” que reveste uma qualquer assunção teológica de algibeira. “Toda a gente sabe” o quanto é fácil absorver e repetir – cultura de caixa de ressonância – mas poucos sabem o valor de questionar, investigar, procurar infirmar e desse ponto (re)construir.
Hoje decidi abordar o tema da tocha de Mário Monteiro. Estando numa pausa forçada por motivos de saúde, é uma questão que não gostaria de deixar passar devido à centralidade que adquiriu no caso. Mais uma vez, não foi dado o devido valor ao que foi revelado e esclarecido. Como iremos ver, a razão é simples. Se o embate da tocha não foi o que se pintou, imagine-se o resto, como tantas vezes apontei nas inúmeras contradições entre testemunhos e por vezes com os próprios (via depoimentos anteriores, declarações publicas).
Tudo começou no dia 15 de Maio de 2018. Poucos minutos passavam da “invasão” que ocorreu entre as 17:09 e as ~17:16 e eram enviadas informações quase que ao minuto desde dentro da Academia de Alcochete, enquanto se ultimavam as fotografias (num total de nove) e vídeos (dois) enviados em conjunto a duas redacções: Cofina e TVI. Tudo isto feito e concluído mais de uma dezena de minutos antes das 18h, não fosse chegar a Direcção e impedir a gasolina que com estratégia se queria espalhar para implodir a direcção do clube.
Uma dessas informações – e recordo a notícia dos “fisioterapeutas esfaqueados” (TVI) que apontou de forma final à fonte, a mesma do envio das fotografias e do vídeo viral – era “foi atirada uma tocha contra Mário Monteiro.”
A descrição divulgada foi aprofundada pouco depois pela ida ao posto da GNR no Montijo: “levei com uma tocha que me queimou o braço e a barriga” (1o Depoimento).
Narravam as notícias que Monteiro “ficara mal-tratado, tal como Dost” (DN, 16/5/2018), simbolizando ambos o apogeu do massacre sangrento que encravou uma porta.
A 23/5/2018 já Mário Monteiro se multiplicava em exclusivos a contar sobre o episódio que lhe teria deixado queimaduras sérias no corpo e na alma (JN, muitos outros). Divulgou igualmente que por consequência iria abandonar o futebol. Voltaremos a este ponto. Descreveu o evento como “o Iraque”, naturalmente, e sobre os ferimentos contou que “fui atacado nos pulsos e no tronco com uma tocha a arder a 240 graus centígrados.” Por outras palavras, um míssil Scud.
Quando vi esta fotografia, umas das nove enviadas em conjunto e que inclui duas da tocha, chamou-me a atenção o facto de aparentar ser algo “de raspão,” e da marca/mancha não poder corresponder aos ferimentos que se falavam. Como andaram a brincar com a tocha armados em fotógrafos (sim tu, Gonçalo), considerei outra coisa, mas fica para mim pelo menos para já. Ainda falta toda a defesa.
Em tribunal, Mário Monteiro assumiu que não ficou com mais do que um vermelhão, quer na zona alegadamente perfurada – barriga – quer na sua mão esquerda, visível na fotografia acima:
“Não vi quantas tochas havia, uma queimou-me a camisola e deixou-me um vermelhão na barriga e no punho esquerdo.” (punho esse visível na foto)
Finalmente se reconheceu o que vários – não todos – testemunhos da GNR, que apenas viram um ferido (Dost), e um par pessoas com credibilidade à prova de bala indicavam.
Custou, mesmo com uma fotografia que sempre fora esclarecedora.
Não foi só o senhor Monteiro que cavalgou a onda mediática. Como podem ver pela imagem, quem disse que quase “foi à cabeça” (Palhinha), quem disse que foi em cheio (muitos, numa súbita memória colectiva até então reprimida), faltou à verdade. Quem lhe viu ferimentos, também faltou a essa mesma verdade, e não é uma questão de semântica: a intenção em induzir em erro é tão clara como o garrafão, que afinal nunca tinha embatido nas costas de Batta, desmentido até pelo próprio após muita mentira.
Do “casual” de Nélson Pereira, ao alvo “jogadores” de Ludovico, passando pela versão Kandahar de Frederico e o seu desvio heróico do super projéctil (contado pelo próprio a Monteiro, veja-se), assistiu-se a todo o tipo de versões de mais um elemento exacerbado e explorado ao ponto de fantasia.
Gostava agora de voltar ao assunto do abandono da profissão. Como se sabe, Monteiro não cumpriu o desígnio do terror, e convicto mas temeroso, encaminhou-se para a Arábia Saudita, um país no qual o sultão Frederico Varandas poderia arrancar cabeças. Não satisfeito, seguiu para a paz do Brasil. A 12/6/2019, à rádio Cidade Hoje:
(Mário Monteiro) Não se sente cansado nem triste com o futebol, “mas há uma altura em que temos que dizer pára. Tenho em mente quando vou abandonar e tenho a certeza de que vou voltar ao ensino que foi de onde saí e onde quero voltar.”
Em nenhum momento falou em Alcochete (pode falar daqui para a frente, tarde demais). Ou seja, há um bom tempo que Monteiro tem essa intenção, até agora retórica, em regressar ao ensino, mas o dinheiro tem falado mais alto. Utilizou o evento em Alcochete para se vitimizar e estabeleceu uma correlação para agravar o cenário, numa exploração que deixou certamente o mestre dele orgulhoso.
Reconheço que esta falta de vergonha de alguns cromos da bola causa-me repulsa.
Já aqui falei das 19 variedades (e há que somar os quatro espaços diferentes) de agressão sofrida pelo patrão eterno de Mário Monteiro, JJ, no artigo “A Paixão de JJ.” Gostei desta parte que se segue relativa a quando Monteiro começou a descrever a saída ao exterior: “Quando saí vi o Jorge Jesus, que estava a sangrar, o William e mais quatro senhores.”
Vou destacar o detalhe “que estava a sangrar”, um elemento tu não te esqueças, enfiado na descrição com a subtileza do baile do elefante numa loja de porcelana.
Volto a repetir, não funciona, cromos da bola.
Em tanta contradição existe uma certeza absoluta: se tivesse sangue (nariz, boca, ambos, compressa, etc) seria fotografado e enviado para as redacções por parte do nosso duo Gonçalo e Frederico. Assim, não seriam nove, mas antes dez ou onze as fotografias. Tudo o que mexesse e pudesse ser usado foi “filma aí” ou click.
A CS bem procurou vislumbrar nessa noite “um olho negro”, algo no nariz, ou o que pudesse fantasiar, mas resultou em nada, quer nessa noite quer quatro dias depois na CI de antevisão à final da Taça.
Agora podem perceber o porquê da fotografia mostrada aqui a Mário Monteiro exibir apenas o mesmo de camisola vestida. Não havia nada para mostrar por baixo, um “vermelhão” não seria bem captado apesar do talento fotográfico de Gonçalo, e preferiram cavalgar uma narrativa exacerbada com conivência acrítica até por fim conhecer agora um ponto final.
Monteiro mencionou ainda que ao voltar a aceder ao balneário para um rescaldo “estava tudo revirado, ninguém mexeu em nada,” algo que com dois simples frames comparativos no anterior artigo, podendo colocar mais e até mostrar a tocha a mudar de sítio e ângulo, se provou falso. Mexeram e desarrumaram mais.
Tem uma tirada que me agradou, nomeadamente quando diz duas coisas contraditórias seguidas a respeito da reunião com a miserável equipa técnica:
Nem sequer abriram a boca os dois (administradores da SAD). Um desses senhores ainda disse, a propósito de estarmos preocupados com os bilhetes para a final da Taça de Portugal: ‘Não faz mal, podem ir ao OLX porque depois da Madeira deve haver muitos…’.
Eu explico ao senhor Monteiro, orgulhoso e temperamental, o porquê de considerações destas não serem chacota, ele que se tem em altíssima consideração apesar do aspecto e a atitude de um imbecil. É a constatação do impacto para os adeptos que o mau profissionalismo na Madeira, e sabe-se lá que mais do que isso, teve para o clube. Evocar uma Taça, da parte da equipa técnica, era uma vergonha após o que comprometeram intencionalmente em dois jogos seguidos, mas no último de forma indiscutivelmente voluntária, suspeita e complacente.
Nunca irão ouvir da parte deles, membros da equipa técnica, uma assunção de culpa, ou o reconhecimento de qualquer erro. São vítimas quando fazem porcaria, nunca são bem despedidos quanto mais repreendidos, e no restante são os maiores, os lords do planeta. Destaco ainda o tom agressivo e arrogante com o qual por vezes o senhor Monteiro respondeu a advogados, e uma altercação bizarra com a Juíza Presidente, na qual o humilde senhor chegou a dizer algo que nunca pensei poder ser dito a um juiz: Isso não é relevante (…) mas não respondo, não interessa.
Assim se encerra o capítulo da tocha Iraquiana. Um evento provavelmente casual, de raspão e com uma relevância muito aquém daquela que se lhe quis atribuir. Foi apenas mais um amplamente manipulado, com plena consciência, num somatório que é já lamentável.
Cá estaremos para continuar a desconstruir aquilo que “toda a gente sabe.”
Nessa farsa toda e que nunca vi ninguém comentar, foi no dia do ataque e enquanto passavam imagens em direto na TV, ainda o BMW não tinha saído de dentro da academia e já estava o porco do rui pedro braz a anunciar que BdC era o autor moral.
Muito bom este artigo.
Continua a mandar cá para fora o que vais encontrando. Esta é a unica forma de nos mantermos bem informados, apesar de toda a propaganda da CS.
Se o MP e os líderes políticos fossem tão protectores para o cidadão anónimo como são para os cromos da bola endinheirados (não todos, visto que há um que perseguem como excepção à regra, acusando-o de ser um terrorista moralista, ou autor moral do terror), sob a égide do sacrossanto Futebol Português e de quem o manipula impunemente para os mais variados fins, mas sempre com os mesmos beneficiados beneméritos, a minha assumpção (e não assunção, com ou sem cristas) seria que poderia este ser um país desenvolvido. Mas é uma hipótese muito remota, uma realidade paralela barrada aos, e pelos, portugueses.
Bons artigos, muitos parabéns, e as melhoras.
fantástico.
muitos parabéns.
uma golpada, cada vez + golpeada….. NOJO
Sem dúvida que foi uma golpada so que felizmente deixou muitos rabos de palha ! Pensei que mentir em Portugal era crime mas parece que para esta gente vale tudo ! Nojentos !