RUGIDO VERDE

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Sexta-feira, Abril 19, 2024

Neste dia… em 1988 – Silas: «O Sporting tem equipa para ganhar a qualquer outra, onde quer que jogue»

Ao contrário do que sucedeu com Douglas, seu companheiro de selecção e de travessia do Atlântico, Silas chegou ao Sporting e garantiu indiscutivelmente um lugar no onze. Ele e Carlos Manuel, duas das unhas que Jorge Gonçalves contratou, são peças fundamentais no miolo da equipa leonina dirigida por Pedro Rocha. No entanto, Silas não se deixa deslumbrar pelo que conseguiu. Atleta de Cristo, acredita que todos os bens materiais e o sucesso são coisas passageiras e que o importante é divulgar a palavra de Deus. Aliás, se o povo diz que todos os caminhos vão dar a Roma, devemos acrescentar que com Silas todas as conversas vão dar a Deus e à Igreja…

Veni, vidi, vici – Cheguei, vi, venci – parece ser o lema do centro-campista brasileiro ao serviço do Sporting, que aos 22 anos tem a sua primeira experiência no futebol europeu. «Vim de um clube que nos últimos anos tem sido o melhor do Brasil. Logo, vim para jogar. O Sporting tem bons jogadores, acho que sempre teve, e eu sabia que não iria ser fácil conquistar um lugar na equipa. Para o conseguir fiz as três coisas que considero indispensáveis nesta profissão: trabalhar, respeitar os colegas… e ser respeitado.

No entanto, se Silas já conquistou os adeptos «verde-brancos», o mesmo não pode dizer-se da equipa, Que muitos teimam ainda em assobiar, mau-grado os resultados positivos que tem alcançado. «Segundo me disseram, o Sporting já não vence há sete anos e os adeptos estão agora com a esperança de voltar aos títulos. Mas não podem ser tão impacientes. A. equipa precisa de apoio e de… paciência! Nada se faz num dia. De resto, o time já melhorou bastante. Cada jogo que passa há mais confiança. Se mantivermos esta tendência de melhorar…»

O primeiro sinal de que os tempos de frustração e desânimo estavam a ser ultrapassados terá sido dado pela vitória sobre o Ajax. A segunda mão da eliminatória, em Amesterdão, irá dizer se os 4-2 conseguidos em Lisboa são suficientes. Mas fica, desde já, uma grande vitória para a equipa leonina: os seus “adeptos “começaram a acreditar nela.

«Antes do primeiro jogo com o Ajax o pessoal não estava com fé nos jogadores. Se tivéssemos ganho por um golo, todos tinham ficado satisfeitos – afinal marcámos quatro… e ficaram chateados por termos sofrido dois. Mas temos vantagem e só dependemos de nós. Lá, dentro do campo, vamos ser 11 contra 11. Os jogadores do Ajax vão querer dar o grito. Vamos sofrer muito, mas até podemos sair de lá com uma vitória…»

O jogador brasileiro demonstra, aliás, uma enorme confiança na sua equipa:

«Creio que o Sporting tem equipa para ganhar a qualquer outra, onde quer que jogue. A única coisa de que precisamos é de mentalização…»

Embora tenha pisado há pouco tempo o Aeroporto da Portela pela primeira vez, Silas já se sente um pouco português:

«É verdade. Já gosto muito disto aqui. Tenho sido muito bem recebido, muito acarinhado. Isso é bom para não ficarmos sempre a recordar o Brasil…»

E as saudades, já roem?

«Não, estou tranquilo. Eu e a minha mulher temos procurado conhecer as coisas daqui. Para além disso, nós, os jogadores brasileiros, estamos muito unidos, muito juntos. Encontramo-nos em casa de um qualquer e falamos das nossas coisas, do que conhecemos do Brasil e do que estamos a conhecer aqui. Esses jantares e reuniões são um bocadinho de Brasil para nós. Parece que estou em casa…»

Dos arredores de Lisboa já conhece as praias da Caparica e de Cascais e Sintra, «um local muito bonito, de paz. Pena é que não deu para ver os castelos. Mas havemos de lá ir com mais tempo…»

Com Silas veio também para Portugal Eliane, a mulher do jogador. Ainda sem filhos, a possibilidade de ter um «português» ainda não é garantida:

«Vamos esperar. Estamos aqui hoje, mas dois anos passam rapidamente. Não dá para andar a mudar de sítio com uma criança atrás. Era estar a prejudicá-la. E depois só estamos casados há um ano. Primeiro queremos viajar e conhecer as coisas bonitas deste mundo. Depois, se fizer um contrato mais longo em Portugal… talvez dê para pensar na criança.»

Do Brasil, Silas trouxe na bagagem muitos livros e discos. Nada de policiais e romances, nem de música popular: a Bíblia, livros referentes à vida cristã e discos evangélicos são as companhias do reforço leonino. É assim o Atleta de Cristo:

«Nesta vida e no futebol nem tudo corre como a gente quer. Como crente em Deus e pessoa que, humildemente, difunde a sua palavra, sei que tudo o que me acontece é para meu interesse, quer seja bom quer seja mau. Se não acreditasse que a mão de Deus está nesta minha vinda para o Sporting estaria a enganar-me.»

Bom profissional e pessoa ponderada, o Atleta de Cristo tem uma função a desempenhar no seio da equipa onde joga:

«Todos nós, humanos, sentimos falta de paz. Mas quando se é bom cristão consegue-se essa paz. A ambição desmedida pode dar cabo de um homem. Hoje tenho muito dinheiro, mas ontem não tinha nada – e amanhã posso voltar a não ter. Por isso, não dá para depositar confiança nos bens materiais. O bem mais importante que tenho é a paz com Deus. E é isso que tento transmitir e comunicar com os meus colegas. Eles percebem que não estou a falar de fantasia…»

Em fim de entrevista, pedimos a Silas que comentasse, sinteticamente, algumas ideias, alguns assuntos. Vejamos o resultado deste jogo de parada e resposta:

Fado – Ainda não fui ver. Deixa acalmar um pouco…

Doping – Não uso. Quem não tem recurso usa.

Droga – Vai para esse lado quem é pobre de espírito.

Brasil – Anda mal. É um país de muita idolatria, que não reconhece Deus. Por isso, vai fazendo loucuras…

Deus – É o factor mais importante em tudo o que me aconteceu. E quem dá alegria à minha vida.

Cristo – É o único que pode interceder por nós junto de Deus, o único que nos pode salvar. Quando uma pessoa acredita nele vive à sua imagem.

Superstição – Não tenho. Agarra-se a ela quem não tem conhecimento de Deus.

Ambição – Não sou ambicioso. . prefiro ser um bom cristão e um bom amigo.

Jorge Gonçalves – O seu projecto está aí, né?

Tempos livres – Tenho ido à Igreja, à praia, a casa dos amigos. De cinema não gosto.

Televisão – Vejo programas desportivos e reportagens.

Imprensa escrita – Estou cá há pouco tempo. O critério de julgamento tem sido bom, embora também existam pessoas mal intencionadas…

Zico/Pelé – Pelé é o número 1. Zico, além de um grande amigo, é um grande craque, um exemplo de vida que deve ser seguido.

Melhor jogador português – Ainda não deu para ver. Futre é muito popular. Melhor jogador brasileiro em Portugal – São três: Mozer, Valdo e Paulinho Cascavel.

Silas – Desse falam os outros…

Profissionalismo – Conheci aqui. É bom. O jogador ainda é o mais importante, felizmente.

Itália – Não gosto de discutir futuro. Se tiver de ir, vou.

Pedro Rocha – Grande treinador. Já demonstrou que tem qualidades. Tem-nos ajudado muito. É respeitado como comandante.

Fonte: Revista Foot, Outubro 1988

Local: Revista Foot, Outubro de 1988
Evento: Entrevista a Silas

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