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Quarta-feira, Maio 01, 2024

“Os meninos vão à luta…” – Entrevista em 1992 aos quatro campeões do Mundo sub-20 (Figo, Filipe, Peixe e Paulo Torres). Parte I – Filipe

Figo, Filipe, Peixe e Paulo Torres: quatro campeões do Mundo de sub-20, quatro jogadores importantes no presente e no futuro do Sporting, quatro mais que prováveis titulares da selecção nacional que vai tentar garantir o apuramento para o Mundial/94.

A FOOT sentou-os à mesma mesa para saber o que já mudou no futebol português e o que é que eles pensam que ainda tem de mudar…

ESTÃO todos aureolados com a conquista do título mundial de juniores, Figo, Peixe e Paulo Torres com o de 91 e Filipe com o de 89. Sabem que por enquanto continuam a ser «meninos do Queirós» e que só passarão a ser olhados como jogadores maduros no dia em que conseguirem um título no seu clube. No entanto, não lhes pesa o fardo e sentem-se mesmo orgulhosos com esse epíteto de «meninos do Queirós», não regateando elogios ao agora seleccionador de todas as equipas nacionais.

Quanto ao Sporting e a Marinho Peres, que tanto têm nos últimos tempos andado nas bocas do mundo por motivos negativos, partilham opiniões: a equipa joga à bola que se farta e vai ser um caso sério nos próximos anos; Marinho Peres sofre da mesma maleita que tem vitimado os treinadores que nos últimos anos passaram por Alvalade – a falta de títulos, indispensáveis para que as águas acalmem.

Pedimos aos quatro internacionais do Sporting uma lista de convocados para um suposto estágio da Selecção Nacional. Aflitos («Podemos esquecer alguém»), lá avançaram nomes:

Guarda-redes: Vítor Baía e Neno.

Defesas direitos: Marinho, João Pinto e Paulo Sousa (o do Boavista).

Defesas centrais: Pedro Venâncio, Fernando Couto, Paulo Madeira, Rui Bento e Jorge Costa.

Defesas esquerdos: Leal, Paulo Torres e Morgado.

Centro-campistas: Carlos Xavier, Paneira, Oceano, Filipe, Rui Barros, Figo, Peixe, Futre e Paulo Sousa.

Atacantes: Águas, Domingos, Cadete, João Pinto e Paulo Alves («O ponta de lança português que melhor sabe segurar a bola» – assegura Filipe).

Quanto ao melhor jogador português da actualidade, deixando de fora os que jogam no estrangeiro, três são unânimes na escolha: Vítor Paneira. Quem discorda é Filipe: «O Peixe e o Figo são actualmente os melhores jogadores portugueses.»

«O que é que tenho de te pagar por causa disso?» – desconfia, a brincar, Peixe… Figo apenas sorri e afirma: «O Paneira sim…»

À mesma mesa, no meio de piropos entre si e muita gargalhada, revelam grande união e enormíssimos respeito e admiração mútuos. Vamos ver o que resultou desta conversa a cinco, com temas iguais para todos.

FOOT – O que é que está a mudar no futebol português?

FILIPE – Além do aparecimento dessa nova geração e desses novos valores, as pessoas já nos vêem de uma maneira diferente. Apostam cada vez mais nos jovens, o que é extremamente importante para nós e para o próprio futebol português.

FOOT – Há essa ideia formada de que os «meninos do Queirós» resolvem os problemas das equipas. É um fardo grande, que se calhar vocês vão carregar ao longo de toda a vossa carreira: serem «meninos do Queirós», da mesma forma que outra geração foi a dos «meninos do Pedroto»…

FILIPE – Quanto a isso há pouco a dizer. O trabalho do professor não pode ser esquecido. Os jogadores que comandou estão a mostrar o seu valor e a dar alguma coisa ao futebol português. «Meninos do Queirós» para toda a vida? Tudo bem…

SELECÇÃO

FOOT – Exceptuando os jogadores e meia dúzia de excepções entre dirigentes e técnicos, parece que toda a gente decidiu embirrar com Carlos Queirós. É fácil passar-se de bestial a besta neste país…

FILIPE – Ele já provou que é uma pessoa com imenso valor. Deixem-no trabalhar à sua maneira, deixem-no continuar a implementar o seu projecto, porque nenhum treinador conseguiu, até hoje, fazer aquilo que ele já fez.

FOOT – Provavelmente, vocês os quatro vão ser mais de um terço da equipa que vai tentar a qualificação para o Mundial. Digam-nos lá três boas razões para acreditarmos que esse sonho é possível.

FILIPE – Acho que temos jogadores de qualidade para chegar à fase final. Temos um treinador que dá garantias. E necessária, por fim, mais organização a nível da Federação Portuguesa de Futebol.

O NOVO JOGADOR PORTUGUÊS

FOOT – O vosso discurso é perfeitamente optimista, embora enquadrado pelo realismo, a que muita gente já se, habituou, vindo dos jogadores que passaram pelas mãos de Carlos Queirós. Também nisso vocês vieram dar uma nova imagem do profissional de futebol, mais culto e mais ponderado nas afirmações do que há uns anos atrás…

FILIPE – Acho que a opinião das pessoas, em relação aos jogadores de futebol (tipos sem cultura, broncos mesmo), tinha de mudar. Parece que isso está a acontecer e já somos olhados como pessoas tão inteligentes como as outras. Ainda bem que é assim.

FOOT – Agora é mesmo só com vocês os quatro: estão habituados a ganhar, mas jogam num clube que não ganha há muitos anos. Também aí pensam que podem alterar alguma coisa, isto é, ajudar o Sporting a regressar às vitórias?

FILIPE – O Sporting tem um excelente e vasto plantel de jovens. Vai ser bom fazer um trabalho a médio prazo. No entanto, não podem só exigir dos mais novos. Há uns anos atrás outro trabalho poderia ser feito no clube, não existisse a pressa nos títulos. O Sporting tem agora grandes valores e todas as condições para atingir os seus objectivos a médio prazo.

FOOT – Marinho Peres?

FILIPE – Tenho um excelente relacionamento com o «mister». Trabalhamos bem, foi ele que me lançou e estou-lhe extremamente grato por isso.

FOOT – Depois destas confusões todas em torno de Marinho Peres, parece claro que ele não vai continuar no Sporting na próxima época. Era ele o homem que podia mudar a sina do clube?

FILIPE – Sabes que os títulos é que mudam qualquer clube e este ano ficámos outra vez a ver o Nacional passar.

FOOT – Toda a gente que acompanha o futebol tem esta época um esquisito paradoxo para tentar explicar: o Sporting é tido como a equipa que melhor futebol pratica, mas em contrapartida está a quilómetros do primeiro lugar. Excesso de «romantismo» na equipa?

FILIPE – Passo…

FOOT – Isso pode significar que estão plenamente de acordo com a profissionalização dos árbitros, tal como a FIFA preconiza, como forma de haver maior responsabilização destes?

FILIPE – Tudo o que puder ser feito para evitar confusões e mal-entendidos no futebol é de aplaudir. Se a profissionalização dos árbitros contribuir para isso, acho que só há motivos para avançar depressa para essa solução.

Data: 01/03/1992
Local: Revista «Foot» - Março de 1992
Evento: Entrevista a Filipe, Peixe, Paulo Torres e Figo

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