RUGIDO VERDE

Levantar e levantar de novo, até que os cordeiros se tornem Leões!

Quinta-feira, Março 28, 2024

Neste dia… em 1983, boas entradas em Alvalade. Golo de Jordão interrompe invencibilidade do rival no campeonato.

O onze que alinhou de início. Em cima, da esquerda para a direita: Meszaros, Jordão, Venâncio, Kikas, Virgílio e Oliveira. Em baixo pela mesma ordem: Ademar, Kostov, Manuel Fernandes, Lito e Marinho.

Fatal como o destino: Sporting – 1, Benfica – 0

Por Neves de Sousa

Foi o lance que marcou o embate Sporting-Benfica mais rodeado de multidão de todos os tempos: Alvalade erguia-se como uma mola, quando o árbitro bejense Rosa Santos assinalava o inexorável «penalty» cometido por Humberto Coelho sobre Jordão, que o angolano iria cobrar sem apelo nem agravo, fazendo o resultado tangencial (1-0) que significou a perda da invencibilidade benfiquista na era-Eriksson (ao 29º jogo) e o revigoramento sportinguista, ampliado pelo desaire dos portistas na Amora. No parque do «leão», nasceu matéria vasta para discussão durante a semana, especialmente em redor dos jogos tácticos que, ontem (pelo menos) deram sinal verde exclusivamente para António Oliveira.

Benfica perde invencibilidade em Alvalade: Táctica: Oliveira, 1 – Eriksson, 0

Que me desculpe o mestre sueco do Benfica: cá para mim, foi no seu banco que se perdeu o jogo, a invencibilidade, o orgulho de caminhar sem peias no «Nacional» cá do burgo. Porque, ao fazer render Diamantino (um avançado) por Frederico (um defesa), mais pareceu estar a defender a derrota tangencial que a procurar arriscar um milímetro num César que sempre poderia fazer um golito ou em Shéu que, certamente, e mesmo a meio tom, meteria mais respeito no centro do campo que um Veloso todo cheio de fibra mas ainda sem a soberana classe do escurinho que não chegou a ser nomeado para trabalho activo. E, logo aqui, surgem dois casos para alongada meditação: estando Carlos Manuel com um golpe na perna direita (teve de ir ao hospital fazer uma suturação) e quase a funcionar em meio gás impunha-se retorquir à bela escalação da juventude de Mário Jorge a render Kostov (que tinha feito bons 45 minutos, mas já não podia com as botas quando veio o intervalo) e, sobretudo, evitar que o possante Festas, mal entrasse em palco, desse o tom de cilindro calcando todas as investidas rubras, reduzindo-as à expressão mais simples, jogando com o físico quando a técnica não conseguia a travagem.

Portanto, fico nesta: o jogo foi ganho por Oliveira e perdido (tacticamente) no banco benfiquista.

Jordão prepara-se para marcar o golo da vitória.

Foi um belíssimo tempo de abertura, com as duas formações a transitarem do estudo mútuo para o contra-ataque brusco: o Benfica a aproveitar a má forma de Ademar (que era um corredor aberto para Chalana e Carlos Manuel), o Sporting a tentar enrolar Humberto e Bastos Lopes que, realmente, estiveram muito aquém do talento do professor e da vocação do aluno. E foi por falha defensiva da sua cortina que o Benfica foi obrigado a duas estupendas paradas, logo prontamente imitadas por Meszaros que, ao longo da hora e meia, seria intransponível obstáculo, barreira de aço com braços como polvos, sempre que o perigo surgia por aquelas bandas: o único erro (deixar um cruzamento de Humberto viajar de poste a poste) terá de levar-se apenas a descrédito de uma defensiva que preferia, sempre, receber a bola pelo ar a vê-la colada ao chão. E, aí, foi outra crassa asneira rubra: apenas João Alves tentou os endosses longos, para as pontas, rasteirinhos. Todos os demais benfiquistas foram para Alvalade mentalizados de que só a cabeça de Filipovic poderia resolver a questão e, abdicando da ciência de Nené, entregaram os trunfos à dupla de centrais verdes, que estavam como peixe na água quando o couro vinha dos céus.

Outra tremenda falha benfiquista residiu no inacreditável «penalty» cometido por Humberto, que já deveria saber de cor e salteado que Jordão é homem de mil ardis e apenas espera um toque mais aparatoso para provocar vistosa grande penalidade. Verdade que, daí a pouco, o árbitro perdoou outro castigo irreparável a Pietra, por golpe quase a papel químico, mas o «capitão» benfiquista tem sempre de fazer aflorar ao subconsciente as qualidades histriónicas de Jordão e o modo (sumptuosamente dramático) como o angolano sabe provocar o «penalty»: e, depois, convertê-lo, sem apelo nem agravo. Em suma: os erros são a fortuna dos advogados. Humberto fez falta, Jordão cobrou, daí a pouco esteve a um passo de se repetir a história, mas, também do lado de lá, na tentativa de recepção de um pontapé de canto (apontado por Chalana), Humberto foi bem desviadinho da bola, acabando estatelado sobre a fofa relvinha e a falar sozinho. O mal dividido pelas duas aldeias.

Um pequeno cãozinho e o árbitro Rosa Santos acabariam por ganhar também direito a história. O bobyzito porque andou a passear por cima do placo como se fosse dono daquilo tudo e só o António Capela, estrategicamente colocado junto a Bento como que à espera do «boneco» que lhe faltava, conseguiu deitar-lhe a luva já quando se preparava a chamada para fuzileiros e caçadores especiais. Um intermédio cómico que depois seria convertido em instante a puxar para o trágico, quando da tremenda dessincronização entre juiz e fiscais, cada qual a mais acelerar nas falhas a solo ou em trio.

Jordão e Manuel Fernandes causam mais uma vez pânico na defesa encarnada

Pior, só o descontrolado «forcing» benfiquista, a que se opôs a serena capacidade de análise do senhor António de Oliveira, ontem (pelo menos) a mostrar que pode jogar e treinar, brilhar e comandar. Verdade que teve a seu lado uma legião de boas-vontades (Meszaros, Venâncio, Kikas, Kostov, Marinho, Lito, Mário Jorge, Jordão, em plano muito especial o estupendo Festas) mas também não poderá esquecer-se que o Benfica dá não sei quantas figuras para qualquer selecção e ontem, em Alvalade, ficou num colete de forças, espartilhado, esvaída a última pinga de sangue, sem qualquer solução a erguer-se do banco, anonimamente resolvido a virar a página e a esperar o futuro. Foi pena: gostávamos de ter visto Eriksson esgotar todas as possibilidades, alterar as pedras que impunham mutação, jogando com os treze artistas que poderia colocar em acção. Restringindo-se a si próprio, passou atestado de fraco valor a quem ficou dentro do fato de treino.

Ficha do jogo:

Arbitro: Rosa Santos de Beja (ajudado por Joaquim Rosa e Francisco Lobo)

Sporting: Meszaros; Ademar, Kikas, Venâncio e Virgílio; Lito (Festas aos 76 m), Marinho, Oliveira e Kostov (Mário Jorge, após o intervalo); Manuel Fernandes e Jordão.

Benfica: Bento; Pietra, Humberto Coelho, Bastos Lopes I e Veloso; Diamantino (Frederico, aos 76 m). Carlos Manuel, Alves e Chalana; Filipovic e Nené.

Cartão amarelo a Venâncio (aos 39’m), (Chalana, aos 57 m), Mário Jorge (aos 68 m) e Marinho (aos 69’m).

Golo: Jordão (aos 49 minutos, de grande penalidade) (Sporting)

Fonte: Jornal Diário de Lisboa

Data: 02/01/1983
Local: Estádio José Alvalade
Evento: Sporting (1-0) Benfica, CN - 14 Jornada

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