RUGIDO VERDE

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Sábado, Abril 20, 2024

Neste dia… em 1950: Benfica (2-3) Sporting – Os Lobos no Jamor

OS LOBOS NO JAMOR

Por TAVARES DA SILVA

Ontem, de manhã, passeava Virgílio, isolado, em Lisboa, quando o encontrámos, trocando breves palavras. Como sabemos a influência que os acontecimentos da bola exercem nos jogadores, tivemos muito prazer em verificar que o seu animo não enfraquecera com a não-selecção e que o rapaz está disposto a lutar pela recuperação do seu posto. Com Canário passa-se o mesmo, Está cada vez mais forte, diligente, com melhor sentido de jogo. Jogadores de temperamento!

Porque há homens a quem um golpe desta natureza ou uma palavra mais agreste da crítica deixa em estado de inferioridade, demorando muito tempo à sua recuperação. É no fundo uma questão de sensibilidade. Várias vezes temos dito aos jogadores quando se nos queixam de injustiças ou se sentem perseguidos, mal ou bem, não importa, que tudo deriva deles próprios. Que, se tiverem valor e vontade, não há critica negativa que lhes corte o russo. Acabarão, fatalmente, por triunfar.

Parece-nos admirável esta atitude de jogo de Canário. Pode ser que os seus dias na Selecção estejam contados, mas ele continuará na luta até ser vencido: e cada vez vai apurando mais as suas faculdades. A sua actuação esteve na base do magnífico jogo rasteiro e preciso laborado pela equipa sportingue. Quando o grupo entrou no chamado trecho do domínio, após a meia-hora de equilíbrio, Canário não só cortou muitas tentativas do adversário como se transformou no ponto de partida de muitos ataques – pondo sempre a bola a rolar na relva e entregando-a nas melhores condições possíveis. Não se pode cumprir com mais aptidão prática rima tarefa. Cumpri-la, aliás, com absoluto sentido prático, sem um arabesco, filigrana ou retardo. O contrário, precisamente, por exemplo, desse estranho jogador que se chama Rogério, o qual é capaz de fazer as mais bizarras jogadas (o lance de ontem com Barrosa é um verdadeiro quadro de futebol!), não tirando delas o proveito que se devia exigir da sua excepcional aptidão.

É curioso verificar-se que, tendo o Sporting dominado e jogado mais do que o Benfica, não se deixou de ter a impressão de que estavam frente-a-frente, duas equipas, devidamente estruturadas. Tomara a Selecção Nacional ter semelhante base, isto é, ser um grupo. E nem por isso se segue que o Benfica tenha dado uma boa medida. Simplesmente, apesar de enteada na teia do adversário, a equipa vermelha conservou à sua organização, valendo-lhe isso ter perdido apenas por uma bola e conservando a duvida até o final – o empate, apesar de tudo, poderia ter surgido na cabeça do fim do esforçado Francisco Ferreira.

A circunstancia do estreante Bastos, uma revelação das balizas, estar muito bem e ter sido afortunado não destrói o apontamento já feito. Porque, em compensação, o ataque sumiu-se quase todo: Melão, Arsénio, Júlio, mesmo Rogério, que dianteiros negativos! Já de outras vezes, aliás, tem sucedido o mesmo, mas na maior parte desses casos os dois homens da linha média cobriram as deficiências à custa de esforço e sacrifício. Ontem não se deu isso nem se podia dar, visto Francisco Ferreira, tocado de curta distensão ter rasgado ainda mais essa lesão.

Pelo contrário, impulsionada pelos médios a linha sportingue da frente evolucionou graça e precisão. Assim, deste modo, foi possível a Jesus Correia, rapidíssimo de movimentos, e com espírito de luta ao ponto de discutir com Félix muitas bolas altas, ligar as duas asas e torná-las niveladas. Temos a assinalar a forma superior de Travassos e a vivacidade desconcertante de Albano, mas há também que ter em conta o mérito da asa Vasques-Martins. E lembrar-se à gente que este Martins, tão hábil e sabedor, anda perdido lá pelas Reservas!

Se a linha de ataque ganhou o encontro, a defesa sportingue podia ter perdido o desafio. Passos praticou mais erros do que o admissível. Enfim, os dois lobos desceram ao Jamor, mas o Sporting tinha fome, enquanto que o outro estava cheio e farto.

Fonte: Diário de Lisboa

Ficha do Jogo:

Estádio Nacional
Árbitro: Reis Santos (Santarém)

Benfica: José Bastos; Joaquim Fernandes, Jacinto Marques, Félix Antunes, Francisco Ferreira, José Rosário, Francisco Moreira, Rogério Pipi, Julinho, Arsénio Duarte e Alfredo Melão.
Treinador: Ted Smith

Sporting: Azevedo; Juvenal da Silva e Manuel Passos; Octávio Barrosa, Carlos Canário e Veríssimo Alves; Albano Pereira, José Travassos, Jesus Correia, Manuel Vasques e João Martins.
Treinador: Sándor Peics

Golos: Rogério 8’ e Julinho 25’ (Benfica) ; Jesus Correia 12′, Martins 19′ e Vasques 30′ (Sporting)

Data: 16/04/1950
Local: Estádio Nacional no Jamor
Evento: Benfica (2-3) Sporting, CN - 23ª Jornada

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