E se tudo correr bem ?
Estas palavras proferidas por Rúben Amorim no dia da sua apresentação entraram, no meu ponto de vista, no panteão das frases imortais do mundo leonino ao mesmo tempo que o famoso «por cada leão que cair outro se levantará» proferidas por António Oliveira.
Eu fui muito critico quanto à contratação de Amorim, não só pela inexperiência do treinador (já lá tivemos alguns sem o respectivo curso) mas pelos valores que se pagaram por ele! Dez milhões por um treinador que para além de não ter ainda o curso, não tinha feito ainda uma única época completa na primeira Liga.
Não culpei o Rúben, culpei quem andou meses a chorar sobre uma «herança pesada» mas que depois pôde estourar 10 milhões num treinador em formação e outros 16 milhões num avançado que marcou menos golos do que o que já cá estava. Mas Rúben Amorim mostrou ter competências que vão muito para além de ser treinador e que foram fundamentais para o nosso sucesso: é um excelente comunicador e um líder nato.
Chegou após várias apostas em treinadores que fracassaram, o próprio Rúben falhou o objectivo do 3° lugar quando chegou, falhou a qualificação para a Liga Europa e fomos eliminados prematuramente da Taça de Portugal. Mesmo assim continuou um verdadeiro trabalho titanico ao criar e consolidar um grupo de jogadores que, individualmente tinham pouca cotação no mercado (ainda me lembro das piadas que os avençados do benfiquistão faziam quando contratamos o Feddal e o Benfica estava prestes a assinar com o Cavani) e tornou-os no grupo de trabalho mais unido e polivalente que vi em muitos anos de sportinguismo.
Literalmente cada um podia ser titular e quem era chamado dava tudo em campo. Tivemos jogos menos conseguidos, mas tivemos muita força e atitude para merecer a tal «estrelinha». E é aqui que volto à frase do Rúben «e se tudo correr bem?», porque o apanágio do Sporting era exactamente o contrário.
A Lei de Murphy foi inventada a pensar em nós. Cada vez que algo podia dar para o torto (tipo o clássico golo marcado no último minuto por um antigo jogador nosso emprestado ao rival) era quase certo que ia acontecer. Aconteceu tantas vezes no passado que esse fenómeno passou a ser chamado pelos adeptos de «momento Sporting» ou «aconteceu Sporting».
Esta aparente fatalidade contribuiu muito para o sofrimento dos Sportinguistas nesta época, ninguém questionava o valor da equipa mas todos sabíamos que se não estivéssemos a ganhar por uma diferença de pelo menos três golos, estavamos sujeitos ao «acontecer Sporting.
Mesmo com dez pontos de avanço sentíamos o campeonato tremido, mesmo com a equipa invicta sentíamos a vitória final em risco. Alguém imaginaria que Porto ou Benfica fossem capazes de perder um campeonato com um avanço desses? Não pois não? Mas no caso do Sporting a possibilidade parecia mesmo real. E cada vez que perdíamos pontos, lá vinha a sensação outra vez que iria «acontecer Sporting».
Isto tornou-se num PTSD (post traumatic stress disorder) e foi aí que Rúben Amorim para além de treinador, director de comunicação e especialista motivacional tornou-se também num inédito «psicólogo da massa adepta». O seu discurso do “jogo a jogo” e que “somos candidatos a ganhar os próximos três pontos” conseguiu, na medida do possível, conter as expectativas e sobretudo as angustias de uma massa associativa que sofreu na pele inúmeras injustiças.
Todos gostam de salientar os 19 anos de jejum mas esquecem-se dos campeonatos que nos roubaram nesses anos e onde nos impediram de crescer como clube de maneira sustentada. Eu lembro-me da época 2005 onde podíamos ganhar tudo mas onde perdemos um campeonato por causa de um golo em falta (Luisão carrega Ricardo em falta dentro dos cinco metros da área de proteção do guarda-redes).
Eu lembro-me da época 2007 onde um golo marcado pela mão de Ronny do Paços de Ferreira nos custou mais um campeonato que merecíamos ganhar. Eu lembro-me de 2016 onde fizemos uma época brilhante mas onde a corrupção (comprovada nos e-mails que então vieram a público) nos impediu de conquistarmos o título de maneira vergonhosa. Esta época tinha tudo para ser igual a tantas outras onde o sistema acabaria por nos sonegar mais um título para depois virem os nossos rivais tratar-nos por Calimeros.
Os sucessivos e ridículos castigos a Rúben Amorim por este dar a sua opinião sobre lances escandalosos não eram aplicados da mesma maneira quando se tratava dos treinadores dos nossos rivais directos ou até dos treinadores de clubes pequenos que sistematicamente criticavam a arbitragem (na maior parte dos casos sem razão nenhuma) após perder contra nós. Treinadores que depois eram roubados contra os outros grandes mais que aí aceitavam o resultado e até elogiavam o adversário.
O caso Palhinha foi o cúmulo do ridículo que se tornou a perseguição ao Sporting (que fazia tanta falta ao campeonato português) onde um arbitro «erra» ao mostrar um amarelo, confessa-o mas o CD (composto essencialmente por pessoas afectas ao Carnidense) não quis saber de nada. CD também que recusou ouvir uma prova audio da inocência de Rúben Amorim quando levou 15 dias de castigo, falhando assim três jogos importantíssimos para o Sporting.
Mas lá está … desta vez não «aconteceu Sporting», desta vez o Leão, que se levantou para tomar o lugar do Leão que caiu, assumiu perfeitamente o seu papel e o Sporting continuou a sua caminhada para o título.
Mais do que isso, tivemos um choro monumental por parte do FC Porto que, neste momento, teve mais penaltis a favor do que o Sporting campeão 2001/2002 e que mesmo assim queixa-se que é prejudicado … ao mesmo tempo que os seus jogadores cometiam faltas e agressões em total impunidade.
Até a ANTF se juntou aos adversários para pedir um castigo exemplar a Amorim por algo que se faz em Portugal há décadas, mas que só agora é problemático. Esta perseguição nojenta e vergonhosa uniu todos os Sportinguistas à volta da equipa de futebol, uma união que só não foi mais visível porque a pandemia impedia manifestações no estádio mas que acabou por transbordar por este país todo.
Os adeptos demonstraram um apoio avassalador a esta equipa quando muitos se tinham esforçado para os dividir em «escumalha» e «pessoas de bem». Finalmente, muitos avençados, vieram promover a ideia que este Sporting foi campeão por causa dos estádios vazios (como se os adeptos que sempre apoiaram a equipa de maneira incondicional durante mais de 90 minutos fossem um factor contra).
Aqui devo confessar que concordo em parte com esta análise, mas não pelos motivos evocados. Os estádios vazios beneficiaram o Sporting na medida que o Benfica não podia enviar convites “VIP” com direito a “discoteca” a árbitros, observadores, delegados ou políticos. O péssimo resultado do carnide este ano, apesar de um investimento de 100 milhões demonstra isso mesmo: “no colinho, no party”.
Sentiu-se que o “Sistema” este ano ia ter uma pronúncia do Norte, parecia que as «consultas extra-matrimoniais» estavam de volta tanto foram os favores feitos à equipa de Sergio Conceição. A «estrelinha» também não lhes faltou, o número de antigos jogadores do clube que marcaram auto-golos ou cometeram faltas para penalti é algo que desafia todas as leias das probabilidades.
Afinal, acabou tudo bem e conseguimos exorcizar vários fantasmas do passado para que possamos voltar a ser o crónico. Aqui fica o meu agradecimento eterno a Rúben Amorim e a esta equipa não só pelo que conquistaram mas por terem mudado um paradigma que há muito nos impediu de sermos felizes.
Obrigado campeões!