RUGIDO VERDE

Levantar e levantar de novo, até que os cordeiros se tornem Leões!

Quinta-feira, Março 28, 2024

A morte de uma doença

Nasci numa família 90% sportinguista. Os outros 10% eram todos da parte do meu pai que bem tentaram, mas nunca conseguiram o seu intento, que eu fizesse parte da linhagem maléfica do clube do regime. Isso era algo que para mim era impensável, mesmo com pouca idade conseguia perceber que ali se agregavam gentes que não me agradavam: chicos-espertos, convencidos, aldrabões e corruptos (não sabia o que significava a palavra, mas sabia a forma escura como trabalhavam).

Sendo parte da casta nascida no início dos anos 90, nunca assisti ao Sporting sem Roquettismo. Era uma coisa que nunca parecia inevitável, pois o Sporting era o clube “dos diferentes” e de “pessoas de boas famílias” e eu, muito ignorantemente, achava que se temos no nosso clube todos os ricalhaços de Portugal, então temos tudo para sermos campeões todos os anos.

Esse sentimento engrandeceu quando ganhámos o maior troféu futebolístico em Portugal, o campeonato nacional. Foi o ano em que comecei a ligar a futebol a sério e por coincidência fomos logo campeões. Que melhor maneira podia existir de começar?

Dois anos depois, mais um campeonato com Jardel, João Pinto, André Cruz, César Prates, Sá Pinto, Niculae, Rui Jorge e companhia a espalhar magia nos relvados . Este foi ainda mais festejado do que o anterior. O país era nosso. E a ignorância era uma bênção.

Desde aí até agora, não mais ganhámos esse título tão ambicionado (com dois roubos de igreja pelo meio, um com um golo com a mão e outro em 15/16 no auge da corrupção do outro lado da estrada). As taças de Portugal, Supertaças e as lutas renhidas pelo primeiro lugar contra o clube do norte foram mantendo os adeptos e sócios a proferir a célebre frase “para o ano é que é”.

Os candidatos à presidência pareciam papéis químicos uns dos outros e nada parecia querer mudar. Este sportinguista que vos escreve, percebeu que algo estava mal quando começou a ler a história do clube num livro que o meu tio-avô me deu, uma espécie de bíblia que passou à geração seguinte.

Onde é que estavam as modalidades? De grande alcance só atletismo, futsal e andebol existiam e estas duas últimas eram sempre batidas por SLB e FCP respectivamente. Onde é que estava o hóquei, o vólei, o basquete e outras que tantas glórias nos deram outrora? Só futebol é que interessava?

O meu despertar deu-se durante a campanha eleitoral que opôs José Eduardo Bettencourt e Paulo Pereira Cristóvão (o candidato da ruptura que se veio a revelar outra mentira).

Mais uma vez os sócios conformaram-se e deram mais de 90% a José Eduardo “Maracas Forever” Bettencourt para presidir. Aqueles dois anos deram-me razão, o que já seria de esperar. O clube fez campanhas miseráveis internamente e na Europa e era gozado por todos. A minha forte convicção era que os croquettes nunca mais poderiam ser presidentes do Sporting, com risco de nunca mais sermos temidos e respeitados.

Mas era bom demais. 2011 ofereceu-me a pior noite da minha vida até à data.

Finalmente depois de tantos anos de espera, tinha aparecido um desconhecido com um projecto com cabeça tronco e membros (aprende Varandas) que tinha tudo para unir os adeptos e converter o Sporting num clube pujante e com alma que luta pelos seus objectivos até ao último segundo.

Bruno de Carvalho foi em crescendo até ao dia da votação e parecia ter tudo para ser o próximo. Ser aquele. Foi-o durante umas horas e eu descansei. Vão alívio.

Num churrasquinho de última hora, alguém conseguiu que Godinho Lopes fosse eleito. Eu não quis acreditar no que estava a ver. Será que estávamos condenados a isto para sempre? Será que os sócios seriam assim tão cegos?

Depois de mais 2 anos de travessia no deserto e de sermos o bombo da festa, lá conseguimos eleger o homem certo para o lugar certo. O homem que me fez sentir criança outra vez e vibrar com cada minuto e cada golo como se fosse o primeiro. Os melhores 5 anos da minha vida como sportinguista.

O clima que se sentia era saudável, respirava-se ecletismo e não baixávamos a cabeça a ninguém. Chorei com o primeiro título oficial de hóquei depois do seu regresso, a Taça CERS, e vibrei meses depois com a conquista da Supertaça frente ao velho rival. Os títulos de futsal caíam em catadupa e o campeonato de andebol voltou a ser nosso mais de 10 anos depois. O futebol passou a ser jogado também por mulheres e ganhámos tudo o que tínhamos para ganhar. As modalidades eram todas ganhadoras.

Era um sonho, só faltava o futebol masculino corresponder da mesma forma, mas estávamos no bom caminho. Finalmente eu tinha o Sporting dos meus ideais, aquele que me foi contado nas belas histórias.

5 anos depois, mais um dia triste como Sportinguista. 71% de ingratos retiram vilmente o melhor presidente do século do cargo, por fazer posts no Facebook e obrigar os jogadores a dar tudo. Bruno de Carvalho tinha mexido com muitos interesses e conseguiram que os interesses acabassem com ele.

Já passou 1 ano e os resultados estão à vista: recordes negativos em todo o lado, falta de militância e, como cereja em cima do bolo, a maior humilhação desde os anos 60. As gentes de bem do princípio do texto voltaram a ter o clube simpático que gostam.

A mim? Conseguiram matar a minha doença. O entusiasmo que tinha e que talvez nunca voltarei a ter, o nervoso miudinho antes do jogos e as noites sem dormir depois de uma derrota, isso tudo desapareceu. Mas nunca virarei a cara à luta, dure o tempo que demorar. Não esperei 20 anos para ter um clube vigoroso para agora o ver morrer assim lentamente.

Nota do editor: texto enviado por Undertaker

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Comments

  1. Neca Pinto

    Caríssimo, acredite que é possível, há muitos a pensar o mesmo. Não podemos desistir ou esmorecer. O Sporting de 2013 a 2018 tem de voltar. O que temos agora é uma fantochada.

  2. miguel canana

    BdC era demasiado bom para ser verdade.

    Foi extraordinariamente bom para um lado e começou a exagerar em mau, para o outro.
    Mas não tenho duvidas que só com um maluco é que se sai deste buraco.
    Só um gajo com tomates para fazer de alvo à bicharada que comanda esta merda é que o SCP vai a algum lado. E, convenhamos, não se arranja disso com facilidade. Principalmente porque não basta ser doido, tem também que saber o que anda a fazer.
    E, mesmo que se arranje, resta saber se consegue resistir à pandilha. Ao BdC lá conseguiram acabar a chamar-lhe um figo… suaram a bom suar, mas conseguiram.

    Vamos continuar a ser geridos por conas de sabão até chegar um doido ou até não haver mais nada para gerir.

    Um gajo normal não consegue, nem se mete nisso.

    SL
    miguel canana

  3. Gomerra

    Mas nada disto é fruto do acaso.
    A ideia é mesmo acalmar os mais fieis para que quando forem vender a SAD ninguem levantar a voz.
    Até é bem visto a venda da SAD, porque o “Manchester” está bem e mais uns disparates.

    Mas continuo a achar que não foram 71% a votar. Foram sim números manipulados.