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Quinta-feira, Abril 18, 2024

Oceano: «em 1989, havia ordenados em atraso e podia ter rescindido. Tive uma proposta do FC Porto, mas não fui porque entendi que seria uma traição»

Oceano Cruz deixou a Selecção Nacional de sub-21 e acusa Gilberto Madaíl de não o ter apoiado. “Nunca foi a um estágio desejar-me boa sorte”, diz, sobre o líder da FPF. O ex-capitão leonino lamenta ainda a pouca consistência exibicional dos verdes-e-brancos.

Correio Sport – Que balanço faz dos quase dois anos à frente da Selecção Nacional de sub-21?

Oceano – Foi positivo, apesar de ter falhado o apuramento para a fase final do Europeu da categoria que se disputa no próximo ano. Foi uma grande experiência e tive grande orgulho em defender a casa que é de todos nós.

– O que falhou no apuramento?

– Admito que podíamos ter feito melhor. Houve jogos em que não fomos eficazes e pagámos caro por isso.

– Se tivesse garantido o apuramento, acha que ainda estaria no cargo?

– Mesmo que me apurasse, sinceramente acho que não continuaria.

Porquê?

– A partir da saída de Carlos Queiroz as coisas estavam definidas. Quem acreditou em mim foi Carlos Queiroz, a quem estarei eternamente grato. Quando ele saiu senti que estava esvaziada a minha capacidade de decidir.

– Então, porque não saiu com Carlos Queiroz?

– Porque ele me pediu para ficar. Falei na altura com Queiroz e ele foi da opinião de que eu devia ficar até ao fim, até porque nos faltavam dois jogos importantes na qualificação – Inglaterra e Macedónia. Foi por respeito a Queiroz e aos jogadores dos sub-21 que me mantive até ao fim, pois faltava um mês para terminar o meu contrato. No entanto, reconheço que o mais lógico era ter colocado o lugar à disposição quando Queiroz saiu.

– Gilberto Madaíl apoiou-o?

– Nunca senti o apoio de Madaíl. Desde que fui seleccionador, ele nunca foi a um estágio desejar-me sorte, ao contrário do que fez com outros seleccionadores da categoria. Pelo que sei, o presidente ia sempre ao primeiro estágio dos sub-21 desejar boa sorte ao seleccionador e ao grupo. Isso comigo não aconteceu.

– Qual o sentimento em relação a Madaíl?

– Fiquei muito desiludido com Gilberto Madaíl. Sinto que ele nunca acreditou em mim.

– Sentiu-se ultrapassado na escolha que Paulo Bento fez em relação a Rui Jorge para seleccionador dos sub-21?

– Acho que a escolha de Rui Jorge já estava feita mesmo antes da minha saída. O seleccionador terá de trabalhar em articulação com o dos sub-21, que é uma antecâmara da selecção A. É natural que Paulo Bento tivesse escolhido uma pessoa de mais confiança dele.

– Qual será o seu futuro?

– O meu passado é futebol, o presente é futebol, por isso o futuro terá de ser futebol. Tenho tido propostas para continuar como treinador, em Portugal e no estrangeiro, ou para trabalhar na gestão do futebol.

– Ser amigo de Carlos Queiroz pode fechar-lhe portas no futebol português?

– A amizade nunca fecha portas. As coisas não são assim e Queiroz tem um prestígio inabalável.

– Com que opinião ficou do processo de destituição de Queiroz?

– Podia e devia ter acontecido de uma forma menos conturbada. Bastava uma conversa entre ele e Madaíl. Mas acho que ainda há muitas coisas por descobrir neste processo. Quando acabar, saberemos toda a verdade e não apenas uma parte da história. Queiroz tem uma palavra importante, que se vai fazer ouvir com a sua defesa.

– Sonha com o regresso ao Sporting?

– Não é uma questão de sonhar. O Sporting será sempre a minha primeira casa e sinto que o meu futuro, mais tarde ou mais cedo, passará pelo Sporting.

– Chegou a rejeitar ser adjunto. Exige o cargo principal em Alvalade?

– Não, de todo. O que eu gostava era de estar numa posição em que me sentisse útil ao clube. Foi sempre isso que disse aos dirigentes. A única exigência é sentir que o meu trabalho possa representar algo de que o Sporting beneficie.

– Alguma falou no seu regresso com José Bettencourt?

– Não. Nunca.

– Como tem visto a época do Sporting?

– Em termos europeus, muito bem. A nível da Liga, a equipa não tem mantido o mesmo nível.

– O que é que tem faltado?

– Consistência. A equipa já quebrou emocionalmente em alguns momentos. A pouca consistência exibicional do Sporting agrava-se com a grande consistência exibicional do FC Porto.

– O campeonato está entregue?

– Não, não está. O FC Porto tem uma vantagem tremenda, mas desde que os campeonatos têm o sistema de três pontos por vitória, é mais fácil encurtar distâncias.

– Acredita que o Sporting pode ser campeão?

– O pensamento do Sporting deve ser o de ganhar os seus jogos e tentar reduzir diferenças para os da frente.

– Muitos têm criticado a falta de sportinguistas na estrutura do clube. Que opinião tem?

– Há muita gente sportinguista com enorme potencial e que podia ser útil ao clube, casos de Manuel Fernandes, Carlos Xavier e Venâncio, entre outros. As SAD afastaram os sócios do clube e o Sporting não sabe aproveitar as figuras do clube. Temo que o afastamento será ainda maior. O Sporting tem negligenciado figuras que podiam ajudar o clube a ser mais forte.

– O que sugeria que pudesse ser feito para reaproximar os sócios do clube?

– O presidente terá as suas convicções e ideias, mas penso que se devia tentar trazer para dentro do clube pessoas que já jogaram no Sporting. Mas não o fazer por fazer, mas sim pelo que essas pessoas podem captar em termos de mobilização.

– O que tem achado do trabalho de Costinha?

– Tem capital de experiência grande que construiu na carreira como jogador, mas está num cargo novo e ainda a aprender. Pode fazer muitas coisas ao serviço do Sporting. Tudo vai depender dos resultados.

– Uma vez que é treinador, pode ser encarado como uma ameaça a Paulo Sérgio?

– De maneira nenhuma. Tenho saudades do Sporting, é uma casa que me irá marcar para sempre, mas nunca vou desejar o mal de ninguém em proveito próprio. Quando acontecer o meu regresso, e se acontecer, será de forma natural.

– Muito se tem falado da juventude dos capitães do Sporting – primeiro Moutinho e agora Carriço. A braçadeira está banalizada?

– Não. Moutinho fez muitos jogos pelo Sporting e não há que falar mal dele como capitão. O Carriço conheço bem. Treinei-o nos sub-21, tem liderança, é respeitado e representa bem a mística do Sporting. A idade não tem nada a ver com a atribuição de uma braçadeira. Fui capitão e sei que essa condição não tem nada a ver com a escolha de campo antes de um jogo. É preciso raça, entrega e ser capaz de empurrar a equipa para a frente, puxar pelos colegas e dar exemplo. O Carriço reúne esses predicados.

– Moutinho saiu do Sporting para o FC Porto. O Oceano foi tentado a fazer o mesmo?

– Fui. No tempo de Jorge Gonçalves como presidente. Havia ordenados em atraso, podia ter rescindido e tive uma proposta concreta de Pinto da Costa.

– E o que disse ao presidente portista?

– Agradeci, mas entendi que seria uma traição, ainda para mais num momento de fragilidade do clube.

– Moutinho agiu de maneira diferente…

– As circunstâncias eram completamente diferentes e não nos podemos esquecer que o Sporting recebeu onze milhões de euros.

PERFIL

Oceano Andrade da Cruz nasceu a 29 de Julho de 1962 (48 anos), em São Vicente (Cabo Verde). Enquanto futebolista actuou a médio e defesa-central e passou por diversas equipas: Almada (1978-1980); Nacional (1980–1982); Sporting (1982-1990 e 1994-1998); Real Sociedad (1990-1994) e Toulouse (1998-1999). Foi internacional sub-21 (4 jogos) e pela selecção principal (54 jogos, 8 golos). Depois da carreira como jogador, estreou-se como técnico na Selecção Nacional de sub-21, onde não conseguiu qualificar a equipa portuguesa para a fase final do Campeonato da Europa.

Fonte: Imprensa da época

Data: 17/12/2010
Evento: Entrevista

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