RUGIDO VERDE

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Sexta-feira, Abril 26, 2024

Neste dia… em 1976 – Entrevista a Conhé, o substituto de Damas

Com o «mister» que temos a dirigir-nos, o título parece estar ainda mais ao nosso alcance.

AQUI NENHUMA BOLA BATERÁ! Eis o que parece dizer-nos Conhé, o homem que em Alvalade ainda não sofreu um único golo. Ao fundo o aspecto assombroso de milhares de espectadores a darem à foto uma beleza invulgar.

CONHÉ é um nome que anda hoje nas bocas do mundo do futebol. Depois de ter representado o Grupo Desportivo da CUF, onde logo mostrou todo o seu indiscutível valor, o actual guarda-redes do Sporting tem confirmado, para aqueles que ainda tivessem quaisquer dúvidas, do seu alto nível futebolístico e da sua alta propensão para o difícil lugar que ocupa no xadrez da equipa que luta, agora mais do que nunca, pela reconquista do título nacional que já tantas vezes conheceu.

Ouvi-lo, nesta hora de justificada esperança que a sua equipa atravessa era missão que se impunha. Daí a nossa deslocação a Alvalade onde ouvimos o n.º 1 «leonino», não por ser o mais importante, mas apenas por ser esse o número que pertence na camisola que enverga domingo após domingo.

Já amigos de velha data, pois na CUF o ouvimos várias vezes, pedimos a CONHÉ que nos dissesse como estava a ver a prova, especialmente tendo em atenção a regularíssima carreira que a sua equipa estava a fazer apesar do nulo do Montijo.

Com a mesma simpatia do tempo em que era jogador dos «fabris», e a mostrar que o facto de estar num dos maiores clubes de Portugal em nada o tinha modificado, CONHÉ começou por nos referir:

– Com sete jornadas cumpridas, consequentemente a pouco mais de um quinto de prova, pouco se poderia adiantar se não fosse o afastamento a que o Sporting está de algumas das mais credenciadas equipas nacionais, exactamente aquelas que lutam directamente pela conquista do título. Noto, para já, uma boa preparação física de todo o conjunto de que faço parte a que não será estranho – porque nunca o poderia ser – a presença de Jimmy Hagan, na realidade um técnico que está a confirmar tudo quanto fez há um ano no Benfica. Além disso – prossegue – a forma como todos colaboram, num espírito de equipa assaz proveitoso e que bem nos poderá levar a posição de maior relevo.

– Ao título, por exemplo, insinuámos.

– Sim, bem pode ser ao título. Não é que estejamos já convencidos de que isso pode vir a ser uma realidade mas apenas possível. Todos nós sabemos que o campeonato é longo, que muitas coisas podem vir a suceder, mas que confiamos numa boa posição, disso ninguém duvide. O que não vamos, isso nunca, é cair em confianças excessivas que bem poderiam vir a fazer perder tudo quanto até aqui conquistámos. De uma coisa pode estar certo. Com o «mister» que temos a dirigir-nos o título parece estar ainda mais ao nosso alcance.

– Como vê a actuação do Benfica e Porto, as equipas que à partida maiores hipóteses pareciam ter para a conquista do primeiro lugar?

– Não quero entrar em campo que não é meu. Julgo, contudo, que qualquer dos conjuntos de que me fala ainda não deixaram de estar interessados nos melhores lugares e que até final do campeonato muitas surpresas poderão vir a causar, para bem do próprio campeonato. No que respeita às razões que têm levado a um menor rendimento dessas equipas julgo não ser a mim que o problema deve ser posto. CONHÉ, sempre delicado e bom profissional, respondia com a ponderação dos profissionais conscientes, sem alardes de superioridade mas antes conscientes de tudo quanto na realidade é o futebol, aquela caixinha de surpresas de onde, de quando em quando, saem as coisas mais inverosímeis. Daí o fazermos nova pergunta:

– Como sentiu a sua mudança de clube que apenas lutava por uma posição condigna e outro cuja massa associativa apenas exige o título?

– Da mesma maneira. Defender as balizas da CUF, do Sporting ou de qualquer outro clube é, e será sempre para mim, a mesmíssima coisa. O esforço e dedicação com que defendo actualmente as balizas do Sporting são os mesmos com que defendi a CUF. Prezo-me de ser um profissional honesto e, como tal, seja qual for a cor da camisola que envergue, tudo farei por justificar, junto dos que em mim confiarem, essa mesma confiança. É certo que um clube como o Sporting exige mais, não em honestidade e dedicação, mas pela alta projecção que tem o número ilimitado de sócios e simpatizantes. Mas daí a dizer que por ser um clube dos chamados «grandes», a minha forma de actuar se tivesse de modificar, isso nunca. Ontem a CUF, hoje o Sporting e amanhã, se a vida a tal obrigasse, qualquer outro, eu, CONHÉ, sempre saberei defender com a maior dignidade possível. Aliás somente assim compreendo um verdadeiro profissional seja em que sector da vida for. Selecção nacional, um tema sempre obrigatório. Pusemos a questão e CONHÉ aceitou, desportivamente, o repto. Eis o que nos disse sobre o triste Portugal-Polónia:

– Falar depois das coisas se terem dado é fácil. A missão do seleccionador é sempre difícil. Falar de estar certa ou errada a escolha abstenho-me até por razões que facilmente deve compreender. Cada homem tem as suas opiniões pelo que cada seleccionador pode ter as suas. Talvez não fizesse, se fosse seleccionador, a mesma selecção, mas como cada um faria a sua, a minha fica para mim…

– Acha bem irem buscar lá fora jogadores que deixam o futebol português em detrimento daqueles que continuam a lutar por uma melhoria da modalidade na nossa terra?

– Esse caso não é virgem no mundo do futebol. Talvez tentasse trabalhar só com a chamada «prata da casa» mas isso é uma opinião pessoal. Com isto não quero porém ferir seja quem for, especialmente no caso a que se deve poder referir, o Alves, pois o seu alto valor de futebolista justifica, plenamente, as vistas do seleccionador. Julgo, isso sim, que tal critério pode originar um certo alheamento da selecção daqueles que por cá andam e que ao saber que uma «vedeta» actua no estrangeiro, exactamente no lugar onde esta actue, deixa de pensar na equipa das «quinas» com total prejuízo desta e do próprio futebol português.

FELICIDADES, MANO. Os manos encontraram-se, e sentindo a voz do sangue, não puderam evitar o desejo de felicidades. De um lado estava o árbitro, do outro o guarda-redes do Sporting. No final do encontro todos estavam felizes. O jogador por não ter sofrido nenhum golo e o mano por não ter tido problemas. Mas apesar da honestidade dos dois lados, estará isso certo, Senhores da Arbitragem?

Sporting e a selecção foram abordados. CONHÉ, que ainda estava a sofrer o cansaço de um treino intensíssimo, tinha de ir almoçar e não seríamos nós a ter o direito de o prender por mais tempo. Daí o despedirmos, pois horas depois um jogo grande o aguardava, jogo que poderá até vir a ter influência decisiva no desenrolar da prova. Lá fora alguns «fans» aguardavam a saída dos seus ídolos de entre os quais hoje CONHÉ é um dos mais admirados. Pelo que nos disse, pela simplicidade que voltou a mostrar-nos, o guarda-redes sportinguista dá-nos a certeza de estar ali um desportista na verdadeira acepção da palavra, um homem que sabe bem os terrenos que pisa e não, como muitos que conhecemos, que andam neste mundo a sonhar com outro em que nunca conseguirão viver, aquele mundo de fantasia que acaba por ser o «cemitério» dos mais sonhadores. CONHÉ, o digno substituto de Damas, falara para GOLO, mostrando confiança no futuro mas consciente das dificuldades que ainda restam até chegar ao fim da prova. Desejamos-lhe felicidades, aquelas felicidades que afinal devem ser desejadas a todos os que, como o n.º 1 do Sporting, sabem ser dignos de si mesmo e pela forma como procedem, no campo ou fora dele, bem merecedores são que o êxito se não esqueça deles.

Fonte: Revista «Golo»

Data: 10/11/1976
Local: Estádio José Alvalade

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