RUGIDO VERDE

Levantar e levantar de novo, até que os cordeiros se tornem Leões!

Sexta-feira, Abril 19, 2024

Neste dia… em 2016 – Crónica por Rogério Casanova, na vitória do Sporting frente ao Marítimo por 2-0 no arranque da Liga

A análise ao filho do pai do João Mário e restantes jogadores do Sporting, por Rogério Casanova

Satisfeito com a vitória sobre o Marítimo (2-0) na 1ª jornada da Liga, Rogério Casanova elogia o grande reforço do Sporting: o relvado

O Sporting derrotou o Marítimo (2-0) em Alvalade, na 1ª jornada da Liga 2016/17. Foto: JOSE MANUEL RIBEIRO/Getty

Rui Patrício

Apareceu aos 15 minutos, a evitar um golo feito com uma mancha in extremis. Não uma daquelas suas manchas habituais, contorcendo o corpo inteiro em pleno ar na forma de uma cruz suástica, mas uma mancha mais modesta, esticadinho no chão. A partir daí, tirando um ou outro susto, assumiu o papel habitual de espectador compenetrado, escondendo bem a irritação que certamente sentiu quando Fransérgio tentou fazer-lhe um chapéu do meio-campo. Um chapéu. Do meio-campo. Ao guarda-redes campeão europeu. Fransérgio saberá quem ele é? Viu televisão nos últimos meses, sequer?

João Pereira

Começou o jogo a todo o vapor, passando os primeiros minutos num vaivém constante pela única faixa de relva ainda iluminada pelo sol ardente – uma zona outrora conhecida na mitologia clássica de Alvalade como A-Faixa-Que-Pedro-Barbosa-Nunca-Pisa. Parece já numa condição física de exceção, que se estende à agilidade mental: cortou uma bola perigosa na área logo a seguir ao 2-0, e ao minuto 83 intercetou uma jogada de ataque porque adivinhou a direção de um passe antes do próprio jogador do Marítimo que o executou. A atacar esteve quase sempre bem, mesmo quando fez cruzamentos para o sítio onde, num futuro próximo, estará uma pessoa ainda por contratar.

Coates

Aproveitou a primeira intervenção no jogo para exibir uma das suas especialidades: acompanhar até ao meio-campo o avançado que recebe a bola de costas, e mandá-lo ao chão antes de ele ter tempo para se habituar à paisagem. O gesto técnico no golo que marcou é extraordinário, de uma forma específica que talvez só a repetição em câmara lenta ajude a elucidar: teve de se encolher bruscamente uma fração de segundo antes de a cabeça colidir com a bola, um espasmo que deixou o marcador directo ser arrastado pela inércia do seu descontraído movimento anterior. Pode ter sido intuição ou planeamento, mas uma coisa é certa: Coates é um falso, e gosta de enganar as pessoas.

Rúben Semedo

Continua a reivindicar adjetivos que pareceriam sarcásticos a quem acompanhou o seu percurso na formação: “concentrado”, por exemplo; ou “seguro”. O certo é que continua a exibir as qualidades físicas e técnicas que o destacaram (velocidade, agressividade na antecipação, bons pés), ao mesmo tempo que vai revelando uma maturidade que poucos esperariam ver tão cedo. O melhor exemplo foi a serenidade demonstrada ao minuto 41, mantendo-se ali quietinho na pequena área enquanto uma procissão de adversários ia falhando oportunidades de golo – à espera do momento certo para aliviar a bola, e sempre corretamente convencido de que não havia qualquer motivo de preocupação.

Jefferson

Falhou passes simples a atacar, escavou buracos enormes nas suas costas depois de cavalgadas inverossímeis e, aos 38 minutos, deixou-se antecipar na área, na segunda grande oportunidade do Marítimo. A zelosa atenção que dedica aos Relatórios & Contas da SAD só podem merecer elogios. Durante duas épocas e meia (com raros intervalos), os 400 mil euros que custou pareciam uma aberração contabilística; a continuar assim, assemelhar-se-à cada vez mais a um jogador que custou precisamente essa quantia.

William Carvalho

Um mau passe longo e um deficiente posicionamento defensivo deram origem à primeira oportunidade de golo do Marítimo. De resto esteve bem, sem atingir ainda aquele estado Zen em que tudo o que ocorre em campo parece deslizar à volta da sua ilusória imobilidade, mas também sem comprometer. Na 2ª parte ainda arrancou um par de movimentos típicos de simplificação das coisas, saindo do meio de barafundas como se estivesse numa prova espectacularmente elaborada dos Jogos Sem Fronteiras: a tentar percorrer brasas ardentes montado num par de chinelos felpudos, procurando superar a marca de pontos da vila de Unterschleissheim.

Relvado

Além de Alan Ruiz, foi o único outro reforço a estrear-se hoje em jogos oficiais. A estreia foi discreta, mas promissora: mostrou-se sempre esclarecido e concentrado, ensaiando boas combinações com o trio de campeões europeus, e não acusou o desgaste à medida que os minutos iam passando. Ainda é cedo para grandes conclusões, mas é inteiramente plausível que tenha conquistado em definitivo o lugar no plantel, e não precise de ser emprestado (para “rodar”) a um clube da terceira liga espanhola.

Gelson Martins

Até ver, parece estar a passar pelo mesmo processo evolutivo que aflige muitos extremos talentosos nas camadas jovens: ao chegar a seniores, tornam-se subitamente “honestos”. As suas fintas são agora prioritariamente mudanças de velocidade e não mudanças de direção. Deve chegar para a maioria dos jogos, tal como chegou para este: ganhou o canto que deu o 1-0, e esteve sempre interventivo e objectivo, mesmo nos momentos em que esperou tempo suficiente para transformar situações de 1×1 em situações de 2×2. Acabou por criar várias oportunidades de golo – em particular na 2ª parte, onde esteve algo melhor do que na 1ª, facto que talvez tenha uma explicação óbvia: não se cansa ao mesmo ritmo das outras pessoas.

Adrien Silva

Parece ainda apenas a 80% da condição física e mental que lhe permite jogar sempre num pico de urgência máxima. É curioso, num jogador tão claramente inteligente e que toma quase sempre a decisão certa, que os seus melhores momentos ocorram quando tem menos tempo para pensar: quando consegue transformar o passe com demasiada força de um colega numa tabela rápida e inesperada, ou quando recupera uma bola no limite, menos à conta de bom posicionamento do que de perfeita intuição muscular.

Bryan Ruiz

Marcou (mal, muito mal) o 2-0 antecipando-se cinicamente ao jogador do Marítimo que estava prestes a fazer um autogolo, e impedindo assim que o nome “Patrick Vieira” ficasse para sempre imortalizado numa ficha de jogo como tendo contribuído para uma vitória do Sporting. No resto do jogo, andou por ali com as suas pantufas aerodinâmicas a fazer o esperado, alternando com ocasionais rasgos inesperados: desmarcações de calcanhar, cruzamentos atrasados – e aquele movimento meta-futebolístico em que deixa a bola correr para fazer um túnel a si próprio, tão típico seu e que, tanto quanto sei, ainda não foi baptizado. (Se Ruiz fosse panamiano, a escolha seria óbvia: “Canal do Panamá”; mas “Canal da Costa Rica” não tem a mesma amplitude cultural e fonética).

Filho do pai do João Mário

Foto: JOSE MANUEL RIBEIRO/Getty

Aos 12 minutos, num remate de ressaca, apanhou a bola como se ele mesmo estivesse de ressaca, regurgitando-a quase pela linha lateral. Já na segunda parte, teve mais duas ocasiões flagrantes, só com Gottardi pela frente: rematou ao lado na primeira, e provocou uma grande defesa na segunda. Pelo meio, bateu o canto para o golo de Coates e foi cartografando pacientemente o relvado a que talvez não vá ter tempo para se habituar, sempre à procura de novos sítios onde pudesse não perder a bola. Saiu a um minuto dos 90, para ser ovacionado e presume-se que vai agora aprender receitas de Esparguete à Carbonara feitas com queijo e não com “natas”, como nesta terra bárbara onde vivemos.

Alan Ruiz

Tal como o relvado, esteve relativamente discreto, mas mostrou, aqui e ali, bons pormenores: uma abusiva cueca perto da linha que viria a criar um lance de perigo; ou o amortecimento perfeito na meia-lua para o remate de João Mário ao minuto 41. Nota-se a falta de hábitos quando pisa os terrenos que no futuro vão ser pisados por outra pessoa, e foi natural vê-lo recuar para pisar os terrenos que no futuro também vão provavelmente ser pisados por outras pessoas.

***

Bruno César

Substituiu Jefferson ao intervalo e falhou uma interceção crucial logo a abrir, permitindo um contra-ataque do Marítimo. Depois foi estabilizando, e mostrou-se sempre certinho a defender e agressivo a atacar, superando por larga margem a deprimente fasquia que lhe fora imposta: fazer 45 minutos melhores que os do colega.

Schelotto

A sua ausência do onze inicial foi uma surpresa. A sua entrada nos últimos minutos foi uma surpresa. A falta de qualidade que mostrou nas primeiras semanas no clube foi uma surpresa. A avassaladora subida de forma nos últimos meses da época foi uma surpresa. A excelente forma física que demonstrou na pré-época foi uma surpresa. É difícil encontrar aspetos de Schelotto que não surpreendam: o homem é o exacto oposto de um spoiler e teremos aqui um empolgante factor X enquanto durar o contrato.

Bruno Paulista

Escassos minutos em campo, mas tempo suficiente para sacar duas belas aberturas para Bruno César, a segunda das quais num lance anulado por fora de jogo inexistente, um assalto inqualificável que pode ter falsificado de forma determinante o resto do campeonato.

Por Rogério Casanova, em tribunaexpresso.pt

Data: 13/08/2016
Local: Estádio José Alvalade
Evento: Sporting (2-0) Marítimo, 1º Jornada CN

Artigos relacionados

Comments

  1. Leão com memória

    Saudades de ler isto no expresso.
    O Rogério devia voltar a fazer isto, nem que fosse no twitter.

Leave a Reply

XHTML: You can use these tags: <a href="" title=""> <abbr title=""> <acronym title=""> <b> <blockquote cite=""> <cite> <code> <del datetime=""> <em> <i> <q cite=""> <s> <strike> <strong>