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Sexta-feira, Março 29, 2024

Entrevista de Soares Franco em 2007: «O passivo consolidado anda à volta de 230 milhões de euros»

Soares Franco: «Já perdemos 12 milhões com impasse da Câmara»

RECORD – O que leva Rui Meireles, ex-director financeiro do clube que conhecia e conhece a realidade do Sporting, dizer que a venda de património não tinha abatido passivo?
FILIPE SOARES FRANCO – Tem de lhe perguntar a ele, não me pode perguntar a mim.

R – Mas se é tão claro, o que é que pode levar a essa dúvida?
FSF – É completamente claro e transparente! Não tenho nenhuma dúvida sobre aquilo que estou a dizer e o dr. Rui Meireles também não, porque foi ele que passou o cheque no dia a seguir. Ele sabe que amortizou 28.5 milhões do Project Finance e que 16.5 milhões foram para abater o défice de tesouraria, até porque ele confirmou na própria entrevista que havia um défice de tesouraria. Isso ele confirma…

R –O Sporting continua a ter défice de tesouraria? De quanto?
FSF – Tem. Tem… Vamos fazer as contas assim, para você perceber. Se o Sporting tivesse mantido o endividamento que tinha – 270 milhões de euros – à taxa de juro actual, isso é que era bom! Eu faço todos os empréstimos a 4,5 por cento, que é a Euribor. Em cima disso há o ‘spread’, que é o que os bancos aplicam… Agora, a Euribor está a 4,78 ou 4,79 e, em cima disso, há 2 por cento de ‘spread’ e o imposto de selo. Dá 7. Multiplique 7 por 270 milhões de euros e faça-lhe a conta… 19 milhões de euros de serviço de dívida, fora aquilo que tem que amortizar. Isso é só custo. A tesouraria é o que faz o desembolso e nós temos de desembolsar. E, no Project Finance, o Sporting é obrigado a pagar 27 milhões de euros se não conseguir renegociar a sua dívida. Ora, 27 milhões é mais de metade do total das receitas do Sporting. Portanto, enquanto o Sporting não conseguir reformular o seu refinanciamento terá sempre défice de tesouraria. O dr. Rui Meireles não deu novidade a ninguém, nem a ele próprio. O que fez foi, sabendo de tudo isto, mandar uma mensagem preocupante para os sócios. Só temos, salvo o erro, e não lhe quero mentir, 230 e tal milhões de euros de passivo. Tínhamos 270 milhões antes do património… Obviamente que temos défice de tesouraria mas porque existem desembolsos para fazer.

R – Está há uma ano e meio na presidência do Sporting e a um ano e meio de sair. Nestes 18 meses vai ter de renegociar essa dívida…
FSF – Estamos a renegociar essa dívida.

R – Esse processo vai ficar concluído até ao final do seu mandato?
FSF – Espero que sim!

R – Mas se não renegociar vai continuar a ter défice na tesouraria…
FSF – Sinceramente, espero que consiga! Mas as condições em que operamos não têm ajudado muito. E sabe porquê? Não é por falta de vontade e de iniciativa do Sporting. Dos dois bancos financiadores, infelizmente para todos, um tem passado por grande perturbação interna que não tem facilitado nada o processo de decisão. Isto dificulta muito os ‘timings’. Mesmo assim, acredito que vamos conseguir porque já conseguimos sensibilizar o BCP para a necessidade da reformulação.

R – O seu objectivo era chegar aos 150 milhões num ano?
FSF – Entre os 150 e os 170 milhões…

R – E está nos 200 milhões, com a Câmara…
FSF – Estamos em cerca de 230, mas espero que, em breve, a Câmara aprove o interface e o processo do loteamento. O protocolo com a Câmara diz que é em Março, portanto até Março. Se isso se concretizar, o endividamento baixará substancialmente e andará entre os 200 e os 210 milhões. A partir daí, temos de fazer uma operação que está na reestruturação da dívida, para baixar o passivo para os 150/160 milhões.

R – Aí será só engenharia financeira… O ‘naming’ do estádio, que chegou a ser opção, não é hipótese neste momento?
FSF – O estádio tem um ‘naming’: Estádio José Alvalade. Isso seria fazer mais uma rotura total com o passado, porque é tirar o nome do fundador e junta-lo a uma entidade que possa patrocinar… Para isso, é preciso que, culturalmente, o Sporting esteja preparado e não sei se está. Eu, pelo menos, não sinto que esteja. E ainda vai demorar algum tempo a mudar um conjunto de mentalidades, no fenómeno desportivo e associativo, não só no Sporting mas também noutros clubes.

R – Isso aplica-se também à alienação de acções da SAD? Chegou a dizer que era preciso mudar mentalidades…
FSF – Eu não disse que era a alienação. Eu disse que não era necessário ter a maioria de uma SAD para ter o domínio da SAD. São duas coisas completamente diferentes.

R – Estamos a falar do aumento do capital social da SAD?
FSF – Não estamos a falar de aumento de capital nenhum, eu não posso falar sobre o aumento de capital …

R – Mas disse, no início da entrevista, que íamos falar de tudo…
FSF – …

R – Um dos seus objectivos não era alienar 27 por cento do capital da SAD?
FSF – Até ficar com 51. Isso faz parte do plano de redução do passivo, mas não posso dizer nada sobre isso.

R – Não se pode, pelo menos, saber se já existem parceiros definidos?
FSF – Não posso falar sobre essa matéria.

R – E quando é que vai poder falar?
FSF – Quando estiver fechado. E comunicado à CMVM.

R – Quer dizer que já encontrou parceiros?
FSF – Não quer dizer nad. E não posso fechar isto sem ter o acordo dos bancos. O que tenho de dizer aos bancos é que chego aos 150 milhões de uma maneira… certo? E, depois, vamos partir dos 150 milhões. Portanto, primeiro tenho de fechar esta equação para depois chegar lá e vender isto. Só depois posso. Até lá não!

R – Porque é que em Dezembro de 2006 disse que a dívida chegaria aos 150 milhões em Junho de 2007? E porque é que houve esse atraso?
FSF – Facílimo! Tínhamos 50 milhões da venda de património, mais 30/35 dos projectos imobiliários. Isto faz 85 milhões. Se tivéssemos concretizado tudo isto na altura que disse, não tínhamos sofrido o desgaste da dívida financeira até hoje e não tínhamos sido penalizados pelo contínuo crescimento das taxas de juro. Depois, derrapámos também com a venda do património, porque primeiro foi chumbado. Só me deixaram vender sete ou oito meses depois… Tudo isto custou uma pipa de massa! A venda deste património deve somar qualquer coisa como 40 milhões. Se você puser, fazendo uma taxa média de 6 por cento, 30 milhões a 6 por cento, dá 1,8 milhões por ano. Se não forem 32 e forem 30, ponha-lhe 2 milhões… Passaram sete anos, faz 14 milhões sem a capitalização de juro. Se o fizer dá uns 16 milhões. Se lhe tirar os primeiros dois anos, que era o normal o projecto demorar na câmara até ser aprovado, temos, só de prejuízo directo, 13 ou 14 milhões de euros.

R – Isso é em relação à Câmara?
FSF – Não, não é em relação à Câmara. Isto são as razões pelas quais o Sporting não pode comprar o Cardozo. É importante a massa associativa perceber isto, e não estou a fazer censura aos outros clubes, atenção! Mas o FC Porto teve uma situação excepcional: o Plano de Pormenor das Antas foi aprovado em situações fantásticas e a Academia ou o centro de treinos foi dado. Não teve que investir. Portanto, o endividamento do FC Porto comparado com o do Sporting é comparar a estrada da Beira com a beira da estrada. E em relação ao Benfica… Fez os mesmos protocolos que nós com a Câmara mas recebeu-os em 2003. Antes do Euro. Foram lá e bancaram tudo. E, na altura em que falei da questão do pavilhão, o presidente do Benfica diz: ‘Vou estar atento se a Câmara der mais um euro ao Sporting do que ao Benfica’. Mas o Sporting, relativamente ao Benfica, já leva uma desvantagem de 12 milhões de euros por causa da derrapagem dos projectos na Câmara…

R – Mas, quando se candidatou, não acreditava que, nesta altura, já teria conseguido sanear as contas?
FSF – Acreditava! Mas passava-lhe pela cabeça que, em termos políticos, houvesse algum partido na Câmara de Lisboa, depois de o Sporting ter feito o que fez por Lisboa para o Euro’2004, ter sido o primeiro clube a fazer o seu estádio, ter sido o primeiro clube a fazer uma Academia, ter sido o primeiro clube a reformular e a reestruturar uma zona urbana que estava completamente degradada, ao fim de sete anos ainda não ter os seus projectos aprovados na Câmara? Passava-lhe pela cabeça que primeiro fosse o PS a não querer votar e agora é o PSD que umas vezes vota contra e outras vezes a favor? A mim não! Partidos que aprovaram tudo, na Câmara, no executivo, na Assembleia Municipal, que ratificaram protocolos, uma, duas, três, quatro vezes… Com uma instituição de utilidade pública, com tudo o que o Sporting já deu à cidade de Lisboa, não me passava pela cabeça…

R – E já lhe passou pela cabeça tomar uma medida radical em relação à Câmara?
FSF – Não sou capaz… Por uma questão de educação e formação não sou capaz… E às vezes tenho pena de não ser capaz… Já pensei várias vezes que não devo ser presidente do Sporting porque, enquanto for, não consigo alterar os meus padrões de conduta, a minha postura, os meus princípios e os meus valores. Agora, este país muitas vezes não está formatado para quem tem os meus padrões de conduta.

R – Acha que essa atitude faz mal ao Sporting?
FSF – Acho. Acho mesmo que faço mal ao Sporting. Se olhasse para a vida de outra maneira já tinha, pelo menos, agitado muito mais os problemas do que agitei.

R – Sente que há má vontade política contra o presidente do Sporting?
FSF – Não. Sinto que os interesses políticos se sobrepõem, muitas vezes, aos compromissos que as pessoas assumem.

R – Não querendo meter consigo, tem mesmo azar…
FSF – …

R – Mas tem mesmo. Quer renegociar a dívida com a banca e o banco atravessa problemas. Deseja ver os projectos imobiliários aprovados e os elementos da Câmara não se entendem. Há eleições e de aprovação nada… Isto é muito azar?
FSF – Não. Tive mais azar ainda logo no princípio, não foi aí… Tive uma campanha do António Dias da Cunha a dizer que eu não devia vender património…

R – Era a posição do antigo presidente do Sporting…
FSF – …

R – Houve mesmo uma tentativa deliberada de fazer cair Dias da Cunha?
FSF – Graças a Deus, tenho perfeitamente documentada e escrita a altura em que saí da administração da SAD e porque saí. Tenho a consciência totalmente tranquila sobre isso. E sei que disse na altura que gostava que ele fosse o presidente do centenário do Sporting. Portanto, não tenho qualquer problema sobre essa matéria.

R – Mas saiu das sociedades …
FSF – Se estiver frontalmente contra um conjunto de decisões, se acha que vão prejudicar o futuro dessa mesma sociedade e se não tem capacidade de inverter essas decisões, a única coisa que pode pedir é que não o façam ser solidário com isso.

R – Mas não quer revelar essas decisões?
FSF – Se quisesse, tinha-o feito na altura. Mas o dr. Rui Meireles sabe. Garanto-lhes que sabe. Se ele quis dizer o que disse a responsabilidade é dele mas que ele sabe, sabe.

R – Qual é o passivo consolidado do Sporting?
FSF – À volta de 230 milhões de euros.

R – E como é que se chega a este passivo?
FSF – Os investimentos que o Sporting fez andaram à volta de 190 milhões de euros. Na Academia, no estádio, no Holmes Place, na clínica, no Alvalaxia… Houve projectos imobiliários que vendemos em conjunto como o Holmes Place, a Clínica CUF, o Alvaláxia e a sede. Projectos que, em termos de caixa, davam prejuízo ao Sporting. Fundamentalmente porque o Alvaláxia perdia dinheiro. O consolidado disto era um prejuízo acumulado ao longo dos anos. O arrastamento dos projectos da Câmara já nos custou 14 milhões de euros e nos primeiros anos a SAD perdeu muito dinheiro.

R – Se era para perder dinheiro porque é que se fez o projecto imobiliário?
FSF – Quando chega a um cruzamento tem sempre várias opções. Não conheço tudo em pormenor mas o projecto empresarial que o Sporting tinha e pôs no papel na altura em que constituiu a SAD – e que passava por uma empresa multimédia, um projecto de franchising e por estes projectos imobiliários – era rentável. Não consigo ir recuperar hoje os documentos que estiveram nessa origem mas o merchandising renderia hoje ao Sporting cerca de cinco milhões de euros por ano. O projecto multimédia rende zero e era para valer muito dinheiro pois íamos vender os conteúdos e uma série de coisas, coisas da economia não real que havia na altura. Mas a nova economia foi um flop em todos os mercados, países e continentes. A base de sustentação era essa e tudo isso aconteceu no Mundo. O projecto imobiliário assentava em dois projectos sólidos: o Holmes Place, que se veio a verificar que era; e a clínica CUF, que rendia muito menos porque não tivemos fundos para a acabar e foram eles que terminaram. Já o centro comercial foi feito por causa do Euro 2004 – o estádio era para ter para 40 mil lugares e um pavilhão. Hoje em dia, nem temos um estádio com 40 mil lugares nem um pavilhão. Hoje, um estádio de 40 mil lugares serviria perfeitamente os interesses do Sporting e era excelente que tivéssemos um pavilhão… Mas isso não censuro. De todo! Estou a constatar factos e eu não censuro as opções tomadas porque, quando foram feitas, tinham fundamento. Essa coisa de acertar no totobola à segunda-feira é porreira, mas ninguém sabe o futuro. Os dirigentes do Sporting eram pessoas superiormente inteligentes, com boas visões estratégicas. O dr. José Roquette já fez empresarialmente coisas muito melhores do que eu. Não creio que não acreditasse na visão que estava a ter do negócio. E quando decidiu, fe-lo bem. O único erro que foi cometido foi passar o estádio dos 40 para os 50 mil lugares porque está provado hoje em dia que não se constrói um centro comercial sem ter um operador na mão. É exactamente como fazer um hotel: se quer vender um hotel já necessita ter a cadeia garantida. Acabámos por ter de ser nós a explorar o centro comercial…

R – Em termos práticos quanto é que o Sporting perdeu?
FSF – 50 milhões de euros, contas redondas.

R – Considera que há má vontade?
FSF – Não. É jogo político. Não é incompetência política. É jogo político puro.

R – Mas porque é que o Sporting não toma uma posição de força?
FSF – Porque o Sporting tem um mau presidente. Tem um mau presidente para defender essas causas, porque se eu fosse…

R – Quais são os princípios que um presidente deve ter para essas causas irem para a frente?
FSF – Maus princípios de conduta.

R – Existe concorrência desleal?
FSF – Se quiser exercer pressão política séria e se quiser utilizar uma instituição de utilidade pública como o Sporting como arma, com a capacidade de mobilização que o Sporting tem, e fazer disto uma arma de arremesso político, consegue. Mas comigo não! Garanto-lhes que um presidente do Sporting, no dia em que sentir que a Câmara o está deliberadamente prejudicar, se quiser mobilizar uma manifestação em frente aos Paços do Concelho, organiza à vontade!

R – Já pensou nessa hipótese?
FSF – Não consigo. Não faço isso porque não corresponde à minha forma de estar na vida. As coisas têm de ser resolvidas pelas entidades competentes, com princípios e valores de bem. É bom que na vida não seja preciso socorrermo-nos destas armas para resolvermos aquilo que nos devem e que devem resolver. Não vou utilizar essas armas.

R – É uma pessoa desiludida com os políticos em Portugal?
FSF – Não se pode generalizar. Não sou um desiludido com os políticos em Portugal. Sou um desiludido com alguns políticos…

R – …Com os da Câmara de Lisboa?
FSF – Não tenho razões de queixa de nenhum dos presidentes da Câmara ao longo do processo de loteamento. Todos se portaram impecavelmente bem. De qualquer modo, eles são presidentes da Câmara, não são um partido que está dentro da Câmara. Mas tive algumas desilusões com o PS e com o PSD

R – O que é que já foi feito em termos de reorganização empresarial do Sporting?
FSF – O Sporting tinha quatro directores-gerais, hoje tem um. Tinha mais cerca de 30 funcionários e uma série de actividades, nomeadamente na área da comunicação, que eram negativas e que hoje estão equilibradas. Tinha também um sistema informático que não funcionava e que está em vias de corresponder às necessidades que o clube tem.

R – Quanto é que esta estrutura custa menos do que a anterior?
FSF – 1.1 milhões de euros por ano.

R – Quando é que espera que o Sporting fique financeiramente estável?
FSF – Espero que, até Junho, o Sporting fique financeiramente estável. Espero… Mas isso não depende de mim. Nós fizemos tudo! Comprometi-me a vender o património, vendi; comprometi-me a lutar para que os projectos imobiliários fossem aprovados e estão a ser; comprometi-me a reestruturar e reorganizar o Sporting, já o fiz; falta-me agora concretizar dois projectos: fechar o problema financeiro do Sporting e propor a construção de um pavilhão.

R – Falou nos 230 milhões de passivo. Tem alguma meta para o eliminar?
FSF – Até Junho de 2008, espero reduzir para os 150/160 milhões de euros.

R – E eliminá-lo na totalidade?
FSF – Isso é uma equação surreal – há sempre um montante de dívida que se consegue suportar e, depois, porque o património tem sempre o seu valor. Não serve para nada estar a pagar impostos em vez de juros. O dinheiro vai sempre para o mesmo lado. É preferível não fazer o esforço financeiro de alavancar a actividade para pagar endividamento e canalizar esse esforço para uma equipa mais competitiva e que obtenha melhores resultados.

«Ciclismo pode levar Sporting a todos os pontos do país»

R – As modalidades do Sporting estão em perigo?
FSF – Não! O problema não está aí. O problema está no que os sportinguistas querem que o Sporting seja. Entre 80/90 por cento das receitas que o Sporting gera estão ligadas ao futebol. Só há uma margem de 10/15 por cento que estão ligadas às modalidades. Não só às modalidadas mas ao universo do Sporting. Depois, o clube tem uma série de outros custos para suportar: o museu que custa dinheiro, a estrutura do Conselho Directivo, relações públicas, secretárias… Tem também uma estrutura de núcleos… O que acontece é que as modalidades, no seu todo, não dão dinheiro, dão prejuízo. A partir daqui passa por uma decisão dos sportinguistas. A especialização implica rentabilização e o Sporting não pode ter modalidades de alta competição se não forem rentáveis, porque significa que estamos a tirar dinheiro bom para colocar em cima de problemas. Não consigo resolver nenhum problema mandando dinheiro bom para cima do problema. Isso é escamotear o problema! O Sporting perdia, em média, 10 milhões de euros por ano em média.

R – Isso era devido às modalidades?
FSF – Era devido à estrutura que tinha. Não tinha feito o novo estádio, não tinha uma Academia, não tinha feito os investimentos que fez. Não digo que vou acabar com o ecletismo, mas também não vou decidir sobre essa matéria. A alta competição no Sporting tem de ser para competir e ganhar. Ou se tem alta competição para competir e para ganhar – e deve-se ter –, e elas têm ou devem ser autosustentáveis, ou senão o que é que estamos a fazer: a tirar dinheiro da formação para pôr nessas modalidades, a tirar dinheiro do futebol profissional para pôr nessas modalidades, a tirar dinheiro da quotização para pôr nessas modalidades… No fundo, é mandar dinheiro para cima de um problema. Depois, temos outro tipo de modalidades, as modalidades onde temos competição e praticantes como a ginástica, a natação ou o karaté.

R – Essas são autosustentáveis?
FSF – Essas são “superhabitárias”. Os praticantes pagam. O Sporting, quando nasceu, foi fundado para fomentar o desporto, para ter praticantes. Não nasceu para ter atletas profissionais. Agora, é uma equação que eu não vou decidir…

R – Mas pretende fazer um referendo sobre as modalidades?
FSF – Não!

R – Mas então como é que os sportinguistas vão decidir?
FSF – No dia em que tiver o clube devidamente estruturado, vou apresentar as contas a todas aos sportinguistas numa Assembleia Geral e eles vão saber directamente o que cada uma custa. A partir daí, vão começar a formular uma opinião…

R – Existe alguma modalidade de alta competição que se autosustente?
FSF –Não, nem o próprio futsal.

R – Qual a solução?
FSF – O futsal está a caminho do equilíbrio. Mas há uma modalidade que o Sporting não vai acabar seguramente nunca, que é o atletismo.

R – O Sporting já fez um apelo ao Governo referente ao atletismo. Como é que está essa situação?
FSF – O Sporting é o clube que até mais medalhas deu a Portugal no atletismo. Cinquenta por cento das vezes que estes atletas correm, competem com a camisola da Selecção Nacional e são pagos pelo Sporting e não pela Selecção. O Governo tem um papel fundamental no fomento e na dinamização do atletismo de alta competição no país. É completamente inaceitável que não tenhamos Em Lisboa uma pista coberta. Com os campeões que temos produzido em pista coberta nas várias modalidades, é inaceitável que o Governo não possa sacrificar do meio dos seus orçamentos 15 ou 20 milhões de euros para fazer uma pista coberta. As medalhas que Portugal ganhou em pista coberta valem muito mais do que os 15 milhões de euros de investimento que depois pode ser autosustentado.

R – Há uma dívida moral relativamente ao atletismo do Sporting?
FSF – Sim. O Governo tem essa dívida moral, que nunca conseguirá pagar. Nem que faça hoje uma pista coberta em Lisboa!

R – O Sporting também tem uma dívida moral com a história e tradição do hóquei em patins no clube?
FSF – Como podia ter com o ciclismo… Mas o Sporting tem hóquei em patins de formação, não tem de competição mas tem de formação.

R – Como é que se entende que João Lagos, conhecido sportinguista, patrocine a equipa de ciclismo do Benfica e não do Sporting?
FSF – Porque os projectos empresariais não se decidem em função da cor da camisola. Decidem-se em função dos projectos que são apresentados. O Sporting não apresentou ao João Lagos nenhum projecto de ciclismo.

R – Porquê? Não considera que poderia ser rentável?
FSF – Não sei se pode ser rentável ou não. Não tenho as contas do Benfica. Duvido que o projecto de ciclismo do Benfica seja rentável, mas admito que até possa ser. O ciclismo é uma modalidade extremamente popular e se o Sporting pudesse encarar algum dia o ciclismo como modalidade devia fazê-lo. É preciso alguém dentro do Sporting que possa pilotar esse projecto, levar esse projecto para a frente. O ciclismo leva o Sporting a todos os pontos de Portugal. A Volta a Portugal tem grande popularidade. Pude assistir a duas etapas na última edição e fiquei fascinado, mas nesta altura não temos nenhuma estrutura interna para respondermos a esse tipo de desafio. Enquanto não sentir o Sporting financeiramente estável não avanço para mais desafios que possam pôr em risco a estabilidade financeira do clube.

Fonte: Jornal Record

Data: 26/12/2007
Local: Jornal record
Evento: Entrevista a Soares Franco

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Comments

  1. Henrique Morais

    Não vale a pena ler o que não deixou saudades. Lembro-me muito bem das Assembleias Gerais no tempo desse senhor que propunha que o património não desportivo fosse vendido. Várias vezes votei contra essa proposta assim como muitos outros sportinguistas. Não o vendeu ele mas veio a ser vendido pelo maçã podre, Bettencourt. Ao longo dos anos vários presidentes venderam o património do Sporting que tanta falta faz e tem feito ao Sporting. No tempo do senhor Soares Franco cheguei a propor que esse espaço do património não desportivo desse lugar a uma Sede onde os associados se pudessem reunir.

    Recordando:

    O Senhor João Rocha vendeu os terrenos onde hoje se encontra os prédios dominados de Aldeia Olímpica. Vendeu ainda os terrenos onde em princípio serviram de estaleiro ao Metro. O Senhor Sousa Cintra também vendeu as bombas da gasolineira Galp e uns andares. O Senhor José Roquete vendeu os terrenos do antigo Estádio que tanta falta nos fizeram e continuam a fazer pois os jogos dos SUB 23, júniores e pelo menos Juvenis deviam ser realizados em Alvalade ou nas proximidades do Estádio José Alvalade para que o Sporting tirasse rentabilidade. Ao longo dos anos que me recordo só temos tido vendilhões e por isso o Clube está como está.

    Continuação de BOAS FESTAS. SL.

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