RUGIDO VERDE

Levantar e levantar de novo, até que os cordeiros se tornem Leões!

Terça-feira, Abril 23, 2024

Neste dia… em 2009 – Entrevista a Meszaros : «Dei uma passa num cigarro durante o dérbi»

Numa entrevista exclusiva ao i, o antigo guarda-redes do Sporting fala, em bom português, sobre os sete anos em Portugal.

14J – CN (02/01/1983) Sporting (1-0) Benfica (Jordão 50′). Em cima da esquerda para a direita: Meszaros, Jordão, Venâncio, Kikas, Virgílio e Oliveira. Em baixo pela mesma ordem: Ademar, Kostov, Manuel Fernandes, Lito e Marinho.

Já se passaram 20 anos mas Meszaros está igualzinho ao que era. Alto e magro, com aquele bigode farfalhudo, a imagem de marca nos anos 80, quando defendeu a baliza do Sporting (1981-83), Farense (1983-84) e V. Setúbal (1986-89). Entra no Hotel Intercontinental, à beira do Danúbio, no lado Peste com vista para Buda, onde tem um encontro marcado com José Alberto Costa, antigo internacional português com carreira feita no FC Porto, e este sim sem o bigode que o caracterizava dos tempos de jogador. Os dois cumprimentam-se efusivamente no átrio, trocam umas piadas e sobem para o restaurante do hotel, onde a selecção acaba de jantar. Meszaros é apresentado a Queiroz, primeiro, e ao resto do grupo, depois. Nenhum jogador português sequer sonhava com a 1.a divisão, quanto mais com a selecção, quando Meszaros actuou em Portugal, mas há um ou outro (como Miguel Veloso) que pára, olha e sorri para ele. É como dizemos: está igual.

Entre apertos de mão e elogios mútuos, houve tempo para Meszaros, ladeado pelo filho Gabor (que fala ainda melhor português que o pai), dar uma entrevista ao i para falar sobre os três clubes portugueses, os Mundiais de 1978 e 1982 com a selecção húngara e o rival Bela Katzirz.

O seu último jogo foi há 20 anos em Aveiro (Beira-Mar-V, Setúbal, 0-0). Que recordações tem de Portugal?

As melhores possíveis. Sempre considerei Portugal como a minha segunda casa. Cheguei lá aos 31 anos, com muita experiência, e sai de lá com 38, como campeão nacional da 1.a divisão (Sporting em 1981/82) e da 2.a (V. Setúbal 1986/87).

No Verão de 1981, o Sporting contrata Oliveira e Meszaros para chegar ao título. Como foi a sua chegada?

Tive uma recepção calorosa. Eles, Manuel Fernandes, Jordão, Eurico, Inácio, José Eduardo, Bastos, Barão e todos os outros, foram sensacionais. Eu vinha do Vasas Budapeste, onde estava desde 1969, e já conhecia o Sporting, porque nos cruzámos na segunda eliminatória da Taça UEFA 1975/76. Ganhámos 3-1 em Budapeste, com 1-1 aos 80 minutos, e perdemos 2-1 em Alvalade, com dois golos de Manuel Fernandes. Naquela altura, o guarda-redes deles era o Damas, capitão de equipa. Na época anterior à minha ida para o Sporting [1980/81], fui novamente a Portugal, mas ao Porto, onde o Boavista nos afastou na ronda inaugural da Taça UEFA, com 2-0 em Budapeste e insuficiente 1-0 no Bessa.

Em dois anos, o Meszaros ganhou tudo, um feito inédito na história do clube. Só aconteceu depois, em 2002.

É verdade, foi campeonato (dois pontos de avanço sobre o Benfica), Taça (4-0 ao Braga) e Supertaça (7-3 ao Braga em duas mãos), mas essa época 1981/82 foi especial porque o treinador Malcolm Allison era especial e o plantel também. Imagine um ataque com Manuel Fernandes, Jordão e Oliveira [juntos, coleccionaram 72 golos em 99 marcados em 43 jogos].

Por falar em Allison, como era ele?

Especial [pausa para um sorriso]. Tinha a sua maneira de pensar e de viver. Era diferente mas bom homem e óptimo treinador. Em 1987/88, fui novamente treinado por ele em Setúbal.

Mas entre Sporting e o Vitória, houve o Farense, não é verdade?

Sim, em 1983/84. Saí do Sporting, que curiosamente contratou outro guarda- -redes húngaro, o Katzirz, que agora é advogado aqui na Hungria e fui para o Algarve, treinado por Mladenov, o Hristo, não o Stoicho que era jogador. E sabe quem estava no Farense? O treinador do Benfica. O Jesus. O Jorge Jesus.

E como era ele?

[Faz gestos com a mão]

Mais ou menos?

Sim. Tinha muita força e corria o campo todo. Jogava no meio [foi a última época de Jesus na 1.a divisão]

Depois, regressou à Hungria mas, inesperadamente, voltou a Portugal.

Foi engraçado, porque nunca pensei num regresso. Estava bem no Gyor ETO quando apareceu a proposta do Setúbal. Tinha 35 anos e não havia nada a perder. O Vitória estava na 2.a divisão e o projecto passava por subir. Nessa época [1986/87], reencontrei o Zezinho e fomos campeões da nossa zona, com nove pontos de avanço sobre o Estrela [onde jogava Jesus], e subimos. Em 1987/88, com Allison, voltei a jogar ao lado de Eurico, Manuel Fernandes e Jordão. Mas havia muito mais talento, como Vítor Madeira, Roçadas, Hernâni e Maside, que jogou no Sporting [em 1988/89]. Acabámos em oitavo lugar, com os mesmos pontos do quinto [Boavista] e a seis pontos da Europa.

Passou seis épocas em Portugal. Qual a melhor exibição?

Pelo Setúbal, em que ganhámos ao Porto, lá em cima, por 1-0 [Aparício, 55′]. Defendi tudo, tudo, até um penálti do Rui Águas. Nessa equipa, Artur Jorge já lançava dois jovens interessantes: Baía e Domingos [7 de Maio de 1989].

Então e nenhum Sporting-Benfica? Lembro-me de um em que até defendeu um penálti do Bento.

Pois, é verdade, mas aí perdi 1-0 [Chalana, 9′] e não fiz uma grande exibição. Esse do FC Porto-V. Setúbal, havia de ver!

Voltando atrás, como é que o Bento se lembra de marcar um penálti?

A mim, sinceramente, não me incomodou nada. Ele rematou e eu defendi [era dia de festa na Luz, porque o Benfica se proclamara campeão nacional na jornada anterior]. Tenho mais gratas recordações do jogo da primeira volta, em que ganhámos 1-0, penálti do Jordão, depois de passarmos o Ano Novo em estágio. O Benfica quase não atacou e até me deu tempo para fumar um cigarro.

Como?

Estava na baliza sem fazer nada e vi um fotógrafo a fumar atrás da baliza. Pedi–lhe o cigarro, dei uma passa, devolvi-lho e continuei a jogar. O fotógrafo tirou-me uma foto no momento, claro.

Essa é boa.

Foi uma situação excepcional. Nunca tinha feito isso nem nunca mais fiz. Foi uma brincadeira. Antes, os fotógrafos estavam ali, encostados aos guarda-redes.

Ainda foi treinador em Portugal?

No Lourinhanense que, na altura [1993/94], era satélite do Sporting. Estava lá um jovem com futuro que se chamava Tiago. Num jantar promovido pela câmara, estava lá o presidente do Sporting, aquele… o das águas… o Sousa Cintra, e eu falei-lhe do guarda-redes Tiago. Ele continua no Sporting, pelo que sei.

Para terminar, a Hungria, finalista do Mundial-54, anda desaparecida do mapa desde o México-86. Porquê?

São períodos incómodos, mas agora estamos a discutir um lugar em 2010…

O Meszaros até jogou em duas fases finais: Argentina-78 e Espanha-82.

Em 1978, o jogo inaugural foi com a Argentina e fomos [faz outro gesto com a mão, este igualzinho ao de Paulo Bento a Lucílio Baptista na final da Taça da Liga, entre Benfica e Sporting]. Fomos roubados. Marcámos primeiro, mas a Argentina, a jogar em casa, deu a volta e ganhou 2-1. Acabámos com nove, devido às expulsões de Töröcsik e Nyilasi [o árbitro era o português António Garrido]. No segundo jogo perdemos com a Itália por 3-1, mas, atenção, estávamos sem os nossos dois melhores jogadores. Se você visse Töröcsik jogar… [revira os olhos, suspira] era um Maradona. Na despedida, em Mar del Plata, perdemos com a França, também por 3-1, naquele jogo que começou mais tarde porque tanto Hungria como França apareceram com equipamentos parecidos. E a França jogou com o do Atlético Kimbeira, equipa local.

Em 1982, outra vez a Argentina. E a Hungria até começou por golear El Salvador.

Toda a gente dizia que El Salvador era difícil. Entrámos como se fôssemos jogar com Argentina ou Brasil. Resultado: 10-1, ainda hoje recorde em Mundiais. O pior veio a seguir. Os jogadores pediram ao seleccionador para descansar os titulares com a Argentina, para dar tempo para preparar a partida com a Bélgica, que ganhara à Argentina no jogo inaugural. Mas não, o seleccionador quis ganhar e usou a equipa titular. Perdemos 4-1, com dois de Maradona, que esteve sensacional e eu nada pude fazer. Seguiu-se a Bélgica. Estávamos a ganhar mas consentimos o empate a 18 minutos do fim e lá fomos para casa outra vez.

In ionline.pt

Data: 11/09/2009
Evento: Entrevista ao Jornal i

Artigos relacionados

Comments

  1. Rei Leão

    Grandes memórias. Meszaros chegou ao Sporting como um dos mais bem cotados guarda redes mundiais do seu tempo.

Leave a Reply

XHTML: You can use these tags: <a href="" title=""> <abbr title=""> <acronym title=""> <b> <blockquote cite=""> <cite> <code> <del datetime=""> <em> <i> <q cite=""> <s> <strike> <strong>