Neste dia… entrevista a Laranjeira em 1977: «Não nos preocupamos apenas com o campeonato, mas também, com a projecção do clube a nível europeu»
Foi uma manhã de muito trabalho em Alvalade. Paulo Emílio, à medida que o tempo passa, vai progressivamente aumentando o tempo de trabalho. O «capitão» leonino João Laranjeira, sem menosprezo para os restantes profissionais do plantel de Alvalade, entrega-se totalmente ao trabalho. A excelente exibição que fez contra o Benfica, fez-nos entender que o magnífico jogador vai ter uma época bastante boa, se as lesões o não apoquentarem.
– Você esteve bastante bem no jogo frente ao Benfica. Mostrou uma forma quase apurada, o que é bom sinal. A que se deve logo de início o seu bom momento?
– Eu, desde sempre, acentuadamente a partir do momento em que ascendi à categoria de sénior, que cuido ao máximo, mesmo em tempo de descanso da minha preparação. Aliás, é normal eu começar bem as épocas. Acontece apenas que sou um pouco azarento com lesões e por vezes não consigo atingir o máximo quando para ele caminho. O ano passado, comecei bem e felizmente não houve percalços e creio que acabei bem. Pois este ano, espero que tudo se repita. Aliás, uma boa preparação em início de época, faz-se sentir pelo campeonato, enfim, durante a época em que é preciso darmos sempre o nosso melhor.
Alguns jogadores, devido a uma preparação adequada, já caminham para uma forma muito considerável!
– Relativamente a todo o conjunto, é de opinião de que os demais companheiros, também caminham para a boa forma?
– Como sabem, as características dos jogadores mudam. Há os que não começam muito bem, mas que depois com os jogos, com a intensificação dos treinos, com a esquematização de jogo, vão encontrando a forma. Há também os que a adquirem de um momento para o outro, do mesmo modo que a perdem. Neste momento, francamente eu gostei do início do campeonato, mas aceito que há muito que melhorar como é lógico. Interessa acima de tudo, uma forma colectiva, o tal momento em que todo o conjunto está a render o máximo em todos os sectores. Quando esse ponto é atingido então tudo está bastante bem.
– Sendo você o «capitão» da equipa e jogando numa posição recuada, pode facilmente aperceber-se da maneira como todos os sectores estão jogando. Que me diz?
– Pois é evidente, que tanto a actuação dos jogadores que já cá estavam, como os que vieram cumpriram, para um primeiro jogo de campeonato. Claro que não podemos esquecer, que jogadores como o Jordão, o Artur e o Manaca, são experientes e podem facilmente integrar-se em qualquer conjunto sem grandes dificuldades. Acho que sim, que todos estiveram bem, ainda que logicamente uns melhores que outros o que afinal acontece sempre e em qualquer altura do campeonato ou mesmo em qualquer jogo.
– E relativamente aos mais jovens, aos menos experientes?
– Eu acho que o ambiente está bastante bom para que os mais jovens se sintam à vontade. Não há agora aquele problema que havia antigamente, que era o dos chamados consagrados não aceitarem assim à primeira a presença de um júnior, não lhe dando, digamos muita confiança. No Sporting actual há de imediato uma convivência com os mais novos que ascendem ao primeiro time e dessa convivência, nasce um ambiente muito bom em que eles sabem que desde que trabalhem e tenham condições para serem titulares, são. Para já é evidente que terão que discutir o lugar. Eles bem sabem que são ajudados no que é possível e quando chegar a hora de fazerem parte da equipa são bem recebidos.
– Mas vê jovens com possibilidades de ainda esta época fazerem parte do primeiro time?
– Claro que vejo. Não falando do Freire que já jogou várias vezes na época passada, há por exemplo o Ademar e outros, para não citar mais nomes, que francamente podem, quando o treinador assim o entender, responder bem a uma chamada.
– O Paulo Emílio, está progressivamente aumentando o ritmo de trabalho. Tudo certo?
– Acho que está absolutamente certo. Já o ano passado, nós tralhámos imenso, começando logo por um ritmo bastante duro. Cada treinador, tem o seu esquema de trabalho e nós jogadores profissionais temos que nos adaptar a esse esquema. É verdade, que de ano para ano, de época para época, quando não acontece na mesma, aos futebolistas depara-se o problema da mudança de treinadores, o que implicitamente, e quase sempre isso acontece, muda também o sistema de trabalho. Em minha opinião, o trabalho feito pelo técnico Paulo Emílio e pelo professor Rodrigues Dias, está a ser francamente bem orientado, com o aumento progressivo de trabalho.
Não nos preocupamos apenas com o campeonato, mas também, com a projecção do clube a nível europeu!
– Esta preparação intensiva de princípio não trará saturação lá mais para diante?
– Em minha opinião, todos os jogadores, mesmo os que actuam na segunda divisão, devem começar a época com treinos intensivos, para arranjar a condição física indispensável para fazer frente ao campeonato e no nosso caso, também às responsabilidades de nível europeu. Nunca será no meio do campeonato ou perto do fim, que se vai intensificar o ritmo de trabalho, pois nessa altura é que será tarde. Acho que sim, que como estamos a trabalhar em profundidade é que interessa.
– Será que se vai dar continuidade, ao que de há algumas épocas se vem verificando, de que o Sporting de quatro em quatro anos, ganha um campeonato?
– Espero francamente que sim. Já agora, como vai fazer quatro anos que não ganhamos, pois que isso aconteça. Dirigentes, técnicos, jogadores e massa associativa esperamos que este ano o título fique em Alvalade. Tudo se está a fazer para isso. Os adeptos do Sporting bem merecem a alegria de ganhar o campeonato. Estamos uma vez mais a trabalhar a sério, portanto eu confio que tudo corra pelo melhor.
– E relativamente às competições europeias?
– Também é muito importante. Temos que nos impor como um clube de nível europeu. O jogar apenas em Portugal, não é o bastante. Há jogadores que precisam ser conhecidos na Europa, ter contactos com outras grandes equipas. Há necessidade do clube ganhar dinheiro no estrangeiro e de nós jogadores sermos lançados. Lamentavelmente tem acontecido por vezes, que não passamos da primeira eliminatória, o que «arruma» por completo as nossas aspirações. Espero que desta vez isso não aconteça e que possamos ir bem longe. Para já, temos que além desta época, nos devemos começar a preocupar, a nível europeu, com a próxima época, fazendo enfim um trabalho a médio prazo, pois o tempo passa depressa.
– O clube despendeu de verbas volumosas com os novos jogadores. Pode ser o mercado europeu que vem ajudar a resolver o assunto?
– Bem. Eu sou um profissional do Sporting. Como tal, tenho que me preocupar com a vida financeira do meu clube, o que é lógico. Pois digo-lhe que sim, que os jogos na Europa, com adversários de nomeada, ajudam sem dúvida a realizar verbas boas que vão certamente permitir que o clube realize o dinheiro que despendeu com as novas aquisições.
– Mudando de assunto. Que me diz sobre a presença do Yazalde em Alvalade?
– Já se diz muita coisa mas nada de verdade. A presença do Yazalde deve-se apenas ao facto de ele estar em Portugal, em trânsito para a Argentina, pois vai estar ligado ao Independente durante duas épocas. Relativamente ao seu real valor, pois é evidente que ele tem o seu nome ligado ao Sporting, que é um jogador muito bom, um marcador de golos, que é afinal o que mais interessa. Mas neste momento, o Yazalde, até por ser estrangeiro, não poderia jogar no meu clube, por haver o Keita. Não. Não há nada quanto ao regresso do Yazalde.
Os jogos contra a Polónia e Dinamarca poucas hipóteses nos deixam para estarmos presentes na Argentina!
– Ainda acredita na presença de Portugal estar na Argentina?
– Digo que nos dois jogos frente à Polónia e Dinamarca, só nos resta fazermos bons resultados, ou sejam, resultados que não desprestigiem o nosso futebol. Francamente que até me parece que já toda a gente se esqueceu de que Portugal ainda tem que jogar com polacos e dinamarqueses. Veja que enquanto a Polónia, por exemplo, que tem quase o lugar assegurado não deixa de fazer jogos por essa Europa fora. Nós até parece que não estamos integrados numa série para o mundial e que temos jogos a fazer. O silêncio em que caímos, parece dizer bem, que estamos de todo afastados do mundial na Argentina. De qualquer modo, estou certo que aqueles que na altura forem chamados a representar o país, vão dar o seu melhor, até pelo seu brio profissional. De resto, aspirações, francamente que não devemos ter, o que é de lamentar.
– Temos portanto que o Laranjeira acredita no Sporting, tanto a nível europeu como nacional, mas não acredita na selecção. É isso?
– É isso mesmo.
A nossa troca de impressões com Laranjeira tinha terminado, O «capitão» da turma leonina, deixou bem expressa a sua determinação, de que, não pode passar mais uma época sem que o título fique em Alvalade. Como costuma ser de quatro em quatro anos, esta época é realmente a indicada.
Data: 13/09/1977
Local: Estádio José de Alvalade
Evento: Entrevista à revista «Golo»
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Era um grande central o Laranjeira. Pena que as lesões nunca o deixaram mostrar toda a sua capacidade.