RUGIDO VERDE

Levantar e levantar de novo, até que os cordeiros se tornem Leões!

Quinta-feira, Abril 18, 2024

Obrigada Pai, por me teres feito Sportinguista

Pediram-me para escrever sobre o Sporting.

Confesso que ainda hesitei porque não sou boa a expressar sentimentos em palavras. Mas quando deixamos falar o nosso coração, tudo se torna mais simples. E é inevitável falar do Clube que Amo sem mencionar o grande culpado por este Amor.

O meu Pai.

Sócio 15856-0 foi sempre um Sportinguista que viveu o Clube com todo o coração. Não falhava um jogo em Alvalade, sozinho ou acompanhado por mim ou por amigos. Quando fiz cinco anos tornou-me Sócia do Sporting Clube de Portugal. Guardo até hoje o meu cartão e o dele, ainda com as quotas de 1994. Depois dessa data mudaram os cartões para os que temos actualmente.

Recordo, com muita saudade, as tardes passadas em Alvalade, sentada na almofada verde escura com o símbolo do Leão que ele me emprestava, para não estar sentada no cimento. Era sagrado comprar-me as queijadinhas de Sintra. Com o passar dos anos, fui ficando mais ferranha que ele, ao ponto de quase arrastá-lo para o Estádio em dias de temporal.

Nos dias em que não ia com ele ao Estádio, esperava ansiosamente pelo Domingo Desportivo para saber o resultado. Nem precisava de ver os golos, só o saber que tínhamos ganho já me deixava feliz.

Quando o Sporting entrou naquele período, que julgávamos nunca mais podermos voltar, o meu Pai continuava a ver os jogos na televisão, mas já não ia com tanta frequência ao Estádio.

Nunca cheguei a entrar no novo Estádio com ele. E acho que só lá entrou uma vez. Andava triste com o período negro que o Clube estava atravessar. Infelizmente, partiu 93 dias antes de ver chegar ao Sporting, um Presidente que nos devolveu a alegria, a raça e a devoção.

Na noite em que foi internado, liguei-lhe depois do jogo, que tínhamos estado a ganhar, mas que acabámos por empatar. Como ele costumava dizer-me… Já nem passou cartão ao que lhe contei sobre o jogo. Não sei se partiu descrente que nunca mais teríamos um Sporting forte.

A partir do momento em que o perdi, entrar no Estádio era como estar um pouco mais perto dele. A minha ligação ao Sporting, que se tornou ainda mais forte, foi a melhor herança que me podia ter deixado.

Nunca tive a curiosidade de lhe perguntar:

  • “Pai, porque é que escolheste o Sporting?”

Acho que foi sempre tão natural ser do Sporting.

O orgulho que eu tinha, e tenho, de ser do Clube do meu Pai. O Pai que fazia as vontades à menina e que ia à loja verde comprar os fatos de treinos que eu queria. Que levou o livro de autógrafos para o Oceano levar para os treinos, para que o plantel o assinasse e que ainda ganhou uma bola autografada. E que sempre que alguém ia lá a casa, a primeira coisa que fazia era mostrar a bola e dizer orgulhosamente que tinha sido o amigo do Pai que lhe tinha oferecido.

O Pai que comprou aquele vinil verde para ouvirmos vezes sem conta “Em frente Sporting!” E que tempos antes de falecer pediu-me que arranjasse esse hino para ouvir no MP3 que lhe ofereci. Estive três meses a viver fora de Portugal e nas cartas que me escrevia, terminava sempre com um “Saudações Leoninas.”

Já depois de sair de casa, era sagrado ligar-me no fim dos jogos para falarmos…do nosso Sporting! Quando tivemos aqueles dois jogos frente ao Manchester City, liguei-lhe quase a ter um ataque de coração. Respondeu-me:

  • “Filhota é só um jogo de futebol, acalma-te.”

Em 2015 ofereci ao meu marido como prenda de aniversário a inscrição de Sócio. E voltei a fazer-me Sócia. Teria tido todo o gosto em ter recuperado o meu número antigo, mas não se proporcionou.

Nesse ano passei por um momento chato em termos de saúde e na manhã em que ia ser internada, pus a tocar, sempre em repeat, “Onde tu fores jogar! Eu vou lá estar!” E ainda passei junto ao Estádio.

Quando tive o meu filho, tinha como sonho, levá-lo a Alvalade, como tantas vezes fui pela mão do avô que não conheceu.

Fi-lo Sócio.

Vê os jogos connosco, grita “golo”, mas não terá ainda interiorizado o que é o Sporting. E se calhar será melhor assim.

Cheguei a ir algumas vezes ao Estádio, gravidíssma, tendo inclusive de pedir autorização médica, para que nada corresse mal. Na altura cheguei a ouvir um comentário muito simpático da minha Mãe:

  • “Já te custa andar com essa barriga, mas para ires ver o Sporting já não te queixas”.

O meu Leãozinho já viveu as emoções do que é apoiar este Clube na minha barriga, mas quando completou a idade de poder entrar no estádio, o Sporting voltou a mergulhar num estado em que acho que ninguém esperava voltar, nem nos nossos piores pesadelos!

Tudo aquilo que estamos a viver de há um ano para cá, tem-me deixado num estado de tristeza e revolta, que nunca pensei voltar a sentir. É a perplexidade de como “é que puderam permitir que voltássemos a isto”.

Felizmente ou infelizmente, acho que ficámos mal acostumados, porque tivemos um Clube de raça e agora voltámos a ser um Clube amorfo, onde anda tudo descrente e sem esperanças num futuro risonho. Foi-nos mostrado que não somos nenhuns coitadinhos. Que também podemos ser um grande clube, tão grande como os maiores da Europa.

Mas para lá chegarmos outra vez, teríamos de ter Leões como Adeptos e não uns gatinhos que preferem viver de aparências a dar o corpo às balas contra tudo e contra todos pelo Sporting! Família não se ataca a si própria, defende-se em conjunto! Os Leões na selva usam a táctica de acção em grupo. Não atacam líderes que fazem de tudo pela sobrevivência do Grupo.

Mas os seres racionais somos nós…os Humanos! Que de humanos não têm nada, porque os humanos devem ser solidários, gratos e muitos esquecem-se desses valores quando ficam bem na vida.

Comemorámos 113 anos no dia 1 e espero, do fundo do meu coração, que o Sporting aguente mais esta tormenta que está a passar e que num futuro muito próximo possamos voltar a ter um Estádio cheio, a ter as alegrias das conquistas que já alcançámos num passado recente e a união que tivemos durante cinco anos e meio.

Por mim, continuarei a Amar o Clube que é o legado do meu Pai, mesmo que me custe não poder realizar o meu sonho, para já.

Aquilo que vai no meu coração só eu sei. E sei que é um Amor que me vai acompanhar até ao fim dos meus dias, mesmo não estando de acordo com aqueles que agora lá estão a matar o Sporting, serei Sempre Leoa!

Obrigada Pai, por me teres feito Sportinguista.

Sporting Sempre.

Saudações Leoninas

Ana Pedro

Sócia 21116

Nota do editor: Este texto foi submetido por um dos nossos leitores

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Comments

  1. Neca Pinto

    Um bonito testemunho que me humidificou os olhos…
    Força Ana.

  2. Manuel António de Carvalho

    Excelente depoimento.Muito fervor sportinguista.Senti esse sentimento quando regressei como sócio em 2015.Nesses três anos de associado vi um Sporting finalmente renascido, motivador que nos fazia encher o estádio, tinha Gamebox, mas ia mais cedo para o estádio para ver todo aquele “chegar” de adeptos, famílias inteiras, gente de todas as idades,e depois dentro do estádio os cânticos.Fantástico!
    Em mim tudo isso morreu em Maio de 2018.Este não é o meu Sporting.Aquele Sporting que me devolveu a esperança e a crença num melhor futuro desportivo.

  3. Tito Estanqueiro

    Fantástico depoimento. Parabéns pela sua fidelidade e paixão pelo nosso Sporting.

  4. Simões

    Lembro-me de me sentar ao pé de uma mulher na bancada norte, topo, que ia sozinha em 1-2 épocas de BdC (onde mantive o lugar, praticamente por baixo de uma entrada), e a cheguei a notar que a certa altura que a mulher já devia estar grávida de uns 7 meses ou mais. Tinha cabelo escuro apanhado meio ondulado/encaracolado.
    Se calhar eu e o meu amigo gritamos golos consigo.
    Lembro-me desta pessoa porque cheguei a comentar com ele “porra, isto é que é dedicação. Ainda começa em trabalho de parto se marcarmos um golo” ehehe.
    Não sei se era você, mas bem haja igual.
    SL.